Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

A comédia que não cansa de fazer o Brasil rir

Em cartaz nos cinemas desde março, 'Os Farofeiros 2' tornou-se o maior fenômeno de bilheteria deste semestre, sendo assistido por quase 1,9 milhão de pessoas | Foto: Divulgação

Entra filme, sai filme, mas ninguém tira "Os Farofeiros 2" do ranking. Desde o início de março, a saga do grupo de amigos que busca descanso num resort muito louco grudou na preferência nacional. As últimas cifras, apontadas pelo portal Filme B (que analisa as receitas do cinema no Brasil) apontou uma bilheteria estimada em 1.890.500 ingressos vendidos. É o segundo título brasileiro mais visto do ano, atrás apenas de "Minha Irmã e Eu".

Bruno Wainer, seu distribuidor, comemora: "Com 'Farofeiros', o nível de identificação é enorme. O Rio de Janeiro e a Baixada Fluminense venderam 700 mil ingressos desses 1.800.000 ingressos. Ele é, particularmente, um fenômeno carioca. Carioca e Baixada Fluminense, São João de Meriti, Caxias, Nova Iguaçu. Um sucesso nessas áreas e, obviamente, subúrbio. É engraçado, porque o primeiro teve um percentual ainda maior de venda de ingressos nessa região. Chegou a 40% no final da carreira do primeiro".

Faz tempo... muuuuuito tempo... que uma comédia hollywoodiana não vira um estouro pop. A última foi "Ted", de Seth MacFarlane, com Mark Wahlberg. Isso foi há... 12 anos. Há muitas razões para essa derrapada do gênero em telas americanas, como as crises econômicas por lá - na virada Oabama-Trump-Biden - e como as patrulhas ideológicas sobre o riso.

Já no Brasil, ainda que esses aparelhos de censura estejam cada vez mais ferozes, o filão vingou... e ainda vinga... sobretudo por conta da sinergia de uma dupla autoralíssima: o roteirista Paulo Cursino e o diretor Roberto Santucci. Unidos durante a feitura do êxito comercial "De Pernas Pro Ar" (2010), eles fundaram franquias ("Até Que A Sorte Nos Separe"), consagraram nas telonas estrelas já famosas na TV (Leandro Hassum e Ingrid Guimarães) e emplacaram via streaming o filme de Boas Festas mais bem acolhido (e mais encantador) de nosso audiovisual: "Tudo Bem No Natal Que Vem" (2020).

Fizeram tudo isso sempre peitando interditos morais, numa estrutura classificada com uma expressão por vezes indigesta na indústria: a "neochanchada". O termo, cunhado em 2012, refere-se a longas-metragens de humor que retratam as subjetividades das classes que "emergiram" no Brasil (ou seja, ampliaram seu poder de consumo) nos últimos 20 anos. A saga da franquia "Os Farofeiros" é uma delas, das boas. O primeiro, lançado em 2018, vendeu 2.604.658 ingressos, consagrando-se como blockbuster.

"Acho que, no momento de reconstrução da relação do cinema brasileiro com o seu público, o 'Farofeiros' tem uma importância muito significativa. Quem gosta de cinema brasileiro é classe B, C ou D se tiver dinheiro para ir ao cinema. É aí que está o tesouro do cinema brasileiro. Para que a classe B, C ou D vá consumir cinema brasileiro, precisa ser filmes em que haja uma super identificação do público com o filme ali mostrado", diz Wainer.

De boas atuações a parte dois está repleta, a se destacar a de Aline Campos, que virou a Goldie Hawn do Brasil, sempre com a expressão de perplexidade precisa nas horas de apuro. É igualmente imponente a composição de Antônio Fragoso como Alexandre, gerente de um time de vendedores que ganha um feriadão num resort da Bahia e se vê forçado - por imposições de sua chefia - a levar seus camaradas consigo. Lima (Maurício Manfrini, o Paulinho Gogó, que é um ímã de risadas), Rocha (Charles Paraventi) e Diguinho (Nilton Bicudo) embarcam com ele no que vai ser a "roubada" do ano. Levam filhas, filhos e companheiras: Renata (Danielle Winitis) Jussara (uma Cacau Protásio impecável no timing da troça), Ellen (a já citada Aline, que não erra uma deixa) e Vanete, vivida por um dínamo do teatro carioca, Elisa Pinheiro. Sempre na leveza, Elisa, com ares de Lois Lane (repleta de sacadas de ternura), e Danielle (com amplo ferramental cômico) dão a medida da doçura de uma ciranda de quiprocós. A sequência do toboágua GG é para ficar nas retinas.

 

A neochanchada dos contrários

Outro título com Aline Campos, também centrado no mote da viagem que vira perrengue, cata seu lugar sob os holofotes das salas de exibição, marcando a volta do artesão Bruno Barreto às telas: "Férias Trocadas". É uma trama de humor leve, que lembra as boas comédias de Adam Sandler da "Sessão da Tarde" e se calça na potência de seu elenco. Edmilson Filho se divide em dois papéis. É o dono de uma escolinha de futebol, José Eduardo aka Zé, e é o empresário... José Eduado aka Edu. O nome é o mesmo, a cara é igual, apesar da diferença nos penteados. Ambos embarcam com a família para uma estada em resorts latinos (de quilates diferentes), mas têm seus destinos confundidos. O arrogante Edu acaba num camping hippie, natureba. Já Zé vai para um hotel de luxo classe AA. Destaque para as atrizes Carol Castro, que encontra um tom melodramático capaz de dar viço ao roteiro, e a já citada Aline, que volta às telas num perfil almodovariano, apostando no excesso de cores (no figurino) e do tom com sabedoria.