Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

CRÍTICA FILME - A DAMA DO LOTAÇÃO: Clássico que não perde o fôlego

Sonia Braga arrebata o público em 'A Dama do Lotação' | Foto: Divulgação

Consagrada sob o olhar de novíssimas gerações em seu desempenho em "Aquarius" (2016), Sonia Braga é o rosto de abre-alas do que promete se tornar a maior micareta cinéfila de 2024 no país: vai ter "A Dama do Lotação", às 23h55 deste sábado, no Estação NET Rio. Neste 23 de março, todas as cinco salas do complexo exibidor de Botafogo, seu saguão e seus corredores vão estar abertos e repaginados para ambientar uma madrugada de projeções contínuas.

A boa alma que bater lá, com ingresso, ali pelo badalar da 0h poderá transitar de forma livre por todas as salas, entrando e saindo das sessões como bem entender e preferir - com respeito ao próximo, é claro. A lista de iguarias que o Estação preparou inclui: "Nosferatu, Uma Sinfonia do Horror", de F. W. Murnau (1922); "Sangue de Pantera", de Jacques Tourneur (1942); "Submarino Amarelo", de George Dunning (1968); o magistral "O Pássaro das Plumas de Cristal", de Dario Argento (1970); "A Bruxa do Amor", de Anna Biller (2016) "O Castelo de Cagliostro", de Hayao Miyazaki (1979); "Ela Quer Tudo", de Spike Lee (1986); e curtas como "At Land", de Maya Deren (1944); e "Maestro Pernalonga", de Chuck Jones (1949). Ao zarpar, o evento põe em seu timão Neville D'Almeida, no longa-metragem que confirmou a habilidade de Sonia em arrebatar multidões, quase um ano após "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976).

Egresso de narrativas experimentais patrulhadas pela Censura, como "Jardim de Guerra" (1969), Neville negociou com Nelson Rodrigues (1912-1980) a possibilidade de filmar o conto "A Dama do Lotação", a fim de fazer dele um tratado libertário sobre o empoderamento de uma mulher oprimida em seus desejos. Solange é desenhada na tela por Sonia como signo de gestos aparentemente simples, que se agigantam poeticamente em sua forma de se impor pelo exercício do prazer. Muitos dos hábitos e práticas que o filme retrata foram esmagados sob o peso da História e, nos novos tempos, soam ásperos na tela. Mas a fúria com que Neville se impõe contra o moralismo e o afogamento da sublimam imagens que nos sufocam, sob a direção de fotografia dionísaca e cálida de Edson Santos.

Em sua trama, uma violência conjugal é o "Basta!" que deflagra uma revolução. Após ser abusada pelo marido na noite de núpcias, Solange passa a rejeitá-lo. A partir daí, faz de um ônibus seu Tinder mecânico particular, buscando encontros aleatórios. A canção de Caetano Veloso, "Pecado Original", tonifica o percurso da personagem ao dizer "Todo beijo, todo medo/ Todo corpo em movimento/ Está cheio de inferno e céu/ (...) Tempo da Serpente, nossa irmã/ Sonho de ter uma vida sã". Esses versos e demais estrofes de Caetano vão se repetir ao longo de 110 minutos, como uma ladainha de louvação à democracia afetiva.

À época de seu lançamento, "A Dama do Lotação" (1978) contabilizou 6.509.134 ingressos vendidos, isso só pelas estatísticas da Embrafilme, pois outras fontes falam em 7,5 milhões de pagantes. É um dos maiores recordes de arrecadação da História deste país nas telas.

 

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