Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Lucas Paraizo: 'O meu contexto é o Brasil'

Lucas Paraizo: 'Deixou-se de lado o ensinar a pensar o roteiro e privilegiou-se executá-lo' | Foto: Divulgação

 

Sinônimo de excelência na escrita de roteiro, referendado com o troféu Redentor de Melhor Roteiro (por seu trabalho no filme "Aos Teus Olhos"), Lucas Paraizo foge do enciclopedismo das fórmulas (de viradas, de conflitos, de ganchos) em seu processo de pensar histórias. Sua noção de método passa mais por atenção à pesquisa, escuta atenta e busca constante pela humanização de figuras que, nas mãos de muita gente, resumem-se a arquétipos. O fenômeno de audiência de "Sob Pressão" e o recente culto a "Os Outros" (que tem duas continuações à vista) cacifaram sua estética na TV. Uma estética de brasilidade latente. Sua redação é pautada por um jargão, "Chora, Brasil!", retratando seu apreço pelo melodrama.

Carioca, Paraizo, que hoje tem 44 anos, estreou com curtas-metragens, em 2007. Tem oito longas no currículo e sete séries. Foi eleito o autor do ano, em 2018, pela ABRA, associação que pensa o papel de scriptwriters no audiovisual. Formado pela Escola de San Antonio De Los Baños, em Cuba, é autor do precioso livro "Palavra de Roteirista", demonstrando que a arte de ouvir é o caminho para se escrever bem.

Professor na alma e na prática das salas de roteiristas que comanda, Lucas vai dar uma aula magna na próxima terça, 19 de março, das 14h30 às 17h, na Biblioteca Parque Estadual, no Centro do Rio. Os ingressos podem ser adquiridos via plataforma Sympla. A mediação será feita pelo cineasta Marcio Debellian, idealizado do projeto Parque das Ideias.

Paraizo conversa a seguir com o Correio da Manhã sobre as marcas autorais de sua criação.

Quando é que um roteiro ganha uma identidade autoral, antes de ganhar as telas? O que dá identidade a um roteirista no conjunto de seus scripts?

Lucas Paraizo: Acho que a autoralidade é fruto de uma boa conceituação e do olhar que o autor tem sobre o mundo. Nossas histórias são fruto da maneira como sentimos e enxergamos a realidade. São frutos de como isso se materializa em personagens, conflitos, desenlaces... Talvez a identidade do roteirista esteja em suas obsessões temáticas e narrativas, em personagens e conflitos que ele persegue através das histórias, ao longo dos anos, em parceria com diferentes diretores.

Como você avalia as técnicas de ensino no roteiro na atualidade e o que ainda fragiliza a prática da escrita no mercado?

Acho que ainda há muitas lacunas na formação dos roteiristas no Brasil. Seja na academia ou em cursos livres, aposta-se mais nas técnicas do que na conceituação. Deixou-se de lado o ensinar a "pensar" o roteiro e privilegiou-se "executá-lo". O fazer é importante, mas o pensar vem antes. A formação do olhar é anterior à escrita. É preciso pensar e repensar a história (e o mundo) antes de qualquer coisa.

De que maneira a sua relação com as formas de expressão narrativas serializadas afetam a sua maneira de: a) pensar o cinema; b) pensar o Brasil?

As narrativas seriadas emprestam ao meu cinema o dinamismo das histórias longas, enquanto o cinema empresta à minha prática serializada a profundidade e a complexidade dos personagens. Pensar histórias é pensar o seu contexto. E o meu contexto é o Brasil e principalmente o Rio de Janeiro. Foi assim nas cinco temporadas do "Sob Pressão" e até agora está sendo assim em "Os Outros". É o cenário e a forma que me interessam. A serialização me permite dar tempo e pontos de vista a mais personagens. A trama fica mais complexa e a identificação do público com seu herói oscila ao longo da narrativa.

De que maneira o roteiro que você busca construir pensa tragédias e melodramas sociais deste país?

Quanto ao roteiro que eu busco, tragédias e melodramas são parte do meu olhar sobre o mundo. Eu vivo assim e luto contra e a favor disso. Meus personagens, também. O existencialismo e seu embate com o contexto social são os motores do meu trabalho.

Quais são os próximos filmes e séries que hão de contar com a sua assinatura?

Esse ano lançamos a segunda temporada de "Os Outros", no Globoplay, e vamos lançar a primeira na TV aberta, além da quinta temporada do "Sob Pressão". Atualmente estou escrevendo a terceira temporada de "Os Outros", em parceria com a diretora Luisa Lima. No cinema, meus próximos projetos são a adaptação da biografia "Revolucionário e gay: a extraordinária vida de Herbert Daniel", de James Green, dirigido pela Flavia Castro, e o novo projeto do diretor Esmir filho, chamado "Indetectável", sobre o HIV hoje no Brasil.

 

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