Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Márcio Rosário: 'A necessidade de se autoproduzir acabou sendo um fator primordial'

Márcio Rosário, ator e produtor | Foto: Divulgação

É difícil entender como um currículo feito o do santista Marcio Rosário, lotado de trabalhos (de prestígio), como ator e produtor, em Hollywood e outros territórios estrangeiros, sob a batuta de medalhões da direção, ainda não tenha atraído mais (e melhores) holofotes para seu talento em terras brasileiras. Neste momento, 59 festivais internacionais já acolheram seu mais recente exercício nessas duas funções: o curta de horror queer "Bergamota", laureado com 18 prêmios planeta adentro. Seu circuito de exibições inclui Estados Unidos, Canadá, Argentina, França, Dubai, Nova Zelândia, Índia, Itália, Finlândia, Nova Delhi, Romênia, Reino Unido, Nigéria e China. Em cada canto desses, a atuação dele impressiona.

Sob a direção de Hsu Chien Hsin ("Desapega"), Rosário interpreta a vítima nada usual de uma dupla de michês violentos, reagindo com sinistras atitudes à homofobia que sofre. Destaque no elenco multiglobalizado de "Rio, Eu Te Amo" (2014), num episódio do mexicano Guillermo Arriaga, Rosário relembra o caminho para impor seu nome como um talento. Talento que faz, cria e compartilha.

Sua carreira tem relevo longo no exterior. Como começou essa trajetória? O que se abriu de oportunidade profissional para você fora do Brasil? Em que países?

Marcio Rosário: Fui estudar inglês nos Estados Unidos, em 1990, e uma coisa me levou a outra. Quando vi, estava fazendo participações em novelas, séries e filmes americanos. Claro que não foi do dia para a noite, e a minha cara latina, junto com meu sobrenome hispânico, somaram muito nessa loteria maluca. Foram quase 20 anos trabalhando nos Estados Unidos, México, Canadá, Japão, e mais recentemente em Portugal. Sempre gostei de produzir, então estar em uma cidade como Los Angeles, onde os atores aprendem desde cedo a necessidade de se autoproduzir, acabou sendo quase um fator primordial a ser seguido. Trabalhar com diretores independentes, seja para filmei um dia ou um mês, trouxe para mim uma vivência de set que abracei com todas as forças. Lembro de todos esses grandes diretores com que filmei. como David Fincher, Takashi Miike, John Schlesinger, Guillermo Arriaga, Sylvester Stallone, Simon West, Mike Mitchell, Wolfgang Petersen, Terrence Malik...

E o chinês nascido em Taiwan e radicado no Catete, Hsu Chien Hsin se junta a esse coletivo, por meio de curtas que expandem seu circuito pelo mundo. Quantos festivais o "Bergamota" tem pela frente?

Ainda esperamos a resposta de mais de 60 festivais. Esse processo de enviar filmes para esses eventos é bem trabalhoso, pois, embora os gêneros suspense e terror sejam muito comuns em muitos eventos internacionais, o Brasil ainda não tem esse nicho bem desenvolvido. Com isso, temos que apresentar o histórico do diretor, do elenco e da produção sempre aos festivais. Venho fazendo esse esforço desde que nosso filme foi finalizado, em julho.

O que te leva a investir nesse filão?

Sou fanático por filmes de terror e suspense. Quando o convite para enveredar pelo gênero veio por parte do Hsu Chien, um roteirista e diretor com quem já tinha trabalhado no passado, não pensei duas vezes. Produzi "Flerte" e "Vazio", dois curtas-metragens que o Hsu dirigiu e ganhamos prêmio no Brasil e no exterior com eles. O "Flerte", por exemplo, ganhou a láurea de melhor curta-metragem de ficção em 2014 pela Academia Brasileira de Cinema e, no LABRFF (festival de cinema brasileiro de Los Angeles), empatou na categoria de melhor curta de ficção com outro filme que também produzi. Com isso, poder fazer o gênero que eu amo, junto com um diretor que admiro e respeito muito, foi praticamente uma brincadeira. Foi um teste que deu muito certo. Pela resposta dos festivais, nas críticas e no público, queremos fazer uma brincadeira maior. Vamos para uma versão longa, que, neste momento, já estamos apresentando para os distribuidores.

O que essa profusão de convites acrescenta à carreira que um filme de metragem curta, e que dimensão de produto ele passa a adquirir?

A julgar pelas críticas e aceitação do nosso curta, principalmente nos festivais do exterior, o nicho de terror e suspense pode abrir portas para produtores, roteiristas e diretores criarem aqui mais filmes nesse gêneros como fizeram com maestria cineastas como Dennison Ramalho e o pai do horror nacional, o José Mojica Martins.

Que histórias mais afetuosas você guarda de seu processo em telas e terras estrangeiras?

Acho que o primeiro filme que fiz... e logo com o grande Terrence Malick... o longa de guerra "Além da Linha Vermelha"... tem um lugar no coração, por era um misto de pavor com felicidade, guiado por um diretor extremamente gentil, numa trama na qual faço um soldado. Estou na cena entre Nick Nolte e John Travolta, dentro do navio, com um elenco estelar de atores americanos. Havia um clima de felicidade de todos, por estarem filmado com Malick e serem gratos por aquele momento. Sempre me recordo disso com um grande sorriso na memória. Agora, tem os filmes de ação. Fiz alguns e eles são uma Disneylândia. É tudo muito grande, com muita preparação física. Como desafio, tenho que falar do filme do Takashi Miike, "The City Of Lost Souls", todo rodado no Japão. O processo de tradução simultânea do japonês para o inglês e o aprendizado da língua foram muito difíceis, mas, tudo deu certo.

Que linha de atuação você, de forma consciente, persegue?

Sou um ator que nasceu no teatro. Amo o palco e o processo de ensaio. Mas meu treino no cinema foi todo nos Estados Unidos onde o processo de ser e de estar, na cena, é importante para muitos diretores que preferem menos ensaios, optando por ver o processo no set. Temos muitos testes antes para chegar ao resultado final e gosto desse afinamento até chegar ao processo do set. Gosto do que é visceral, mas amo mais ainda o jogo do olhar dos meus companheiros de cena. Esses encontros são mágicos. Gosto de pensar que a magia do cinema se faz da união de muita gente trabalhando. Todos com uma vontade imensa para que todo o processo tenha um resultado positivo.

 

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