Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

O amor contra a censura iraniana

Os diretores Maryam Moghaddam e Behtash Sanaeeh foram proibidos pelo governo iraniano de viajar para o Festival de Berlim, que exibe 'My Favourite Cake' | Foto: Divulgação

Um ano depois da consagração de "Vidas Passadas" (um sucesso no Brasil) e cerca de 31 anos depois de revelar "Antes do Amanhecer", a Berlinale volta a fazer jus a seu talento para revelar e consagrar histórias de amor suspirantes com a exibição de "My Favourite Cake" na disputa pelo Urso de Ouro de 2024.

A diferença para suas descobertas anteriores no gênero é o triste contexto político por trás de uma trama outonal envolvendo dois septuagenários: uma viúva e um taxista. Seus diretores, a dupla Maryam Moghaddam e Behtash Sanaeeha (de "O Perdão"), foi proibida de viajar para a capital alemã por um veto das autoridades de seu país, o Irã. Eles são acusados de desafiar os códigos morais iranianos em relação ao uso de hijab, uma espécie de touca (com aspecto de véu), que cobre a cabeça feminina de forma bem justa.

A interdição da presença de Maryam e Behtash foi recebida pela direção do Festival de Berlim como um atentado à liberdade de expressão e um retrocesso em relação ao tratamento das mulheres.

"Decidimos ultrapassar as restrições legais e pintar um retrato real das mulheres iranianas", disseram os realizadores numa carta lida diante da imprensa pela atriz e jornalista Lily Farhadpour, que protagoniza "My Favourite Cake" ao lado de Esmaeel Mehrabi.

Ela vive Mahin, que perdeu o marido há cerca de três décadas, criou (bem) a filha e hoje vive sozinha, aos 70 anos. Na mesma idade, o motorista Faramarz (papel de Esmaeel) também lida com a solidão em seu dia a dia. Porém, durante uma noite, num encontro casual, eles vão provar do gostinho do benquerer.

Tal sinopse pode sugerir apenas doçura. No entanto, "My Favourite Cake" sabe ser áspero ao expor a brutalidade policial na repressão de jovens estudantes que ousam sair de casa com os cabelos à mostra. "Sonhamos com o dia em que nosso filme poderá ser exibido nas telas de nosso país", disseram Maryam e Behtash no texto enviado à Berlinale, que pode dar a eles um prêmio coletivo de Melhor Interpretação, coroando Lily e Esmaeel.

Nos últimos 15 anos, o festival confiou seu Urso de Ouro há três filmes que contestaram os ditames iranianos: "A Separação" (2011), "Táxi Teerã" (2015) e 'Não Há Mal Algum" (2020).

 

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