Javier Mariscal: 'Cada depoimento carrega uma memória'

Por Rodrigo Fonseca (Especial para o Correio da Manhã)

Javier Mariscal: 'Na animação o público faz um pacto com o que os desenhos nos mostra'

Apesar da curta estada na cidade, o designer e animador valenciano Javier Mariscal, de 73 anos, aproveitou sua passagem em terras cariocas, na abertura oficial do Festival do Rio no Odeon, na quinta passada, para dançar no palco do cinema, celebrar a beleza arquitetônica do Centro da cidade e aprender infâmias. A mais usada por ele: "O que tem de mais bonito em Niterói é a vista do Rio". É uma forma que descobriu para fazer graças com o colega niteroiense Marcello Quintanilha, mestre das HQs, ganhador do troféu Jabuti por "Escuta, Formosa Márcia", que foi seu parceiro na feitura da animação "Atiraram no Pianista". O longa, que estreia no dia 26, abriu a maratona cinéfila.

"Na animação o público faz um pacto com o que os desenhos nos mostra", disse Mariscal ao Correio, na sede do festival, na Glória, ao comemorar o sucesso d vendas da HQ homônima baseada no filme, que tá vendendo aos baldes na Espanha. "Estamos em primeiro nas livrarias".

Quem está no foco do quadrinho e do longa criados por Mariscal em duo com o cineasta Fernando Trueba (de "Quero Dizer Que Te Amo") é o ás do piano Tenório Jr. (1941-1976). Na virada dos anos 1970, em Buenos Aires, ele saiu para comprar um sanduíche, cigarros & afins e... sumiu, ou... foi sumido.

"Tenório foi desaparecido, torturado, destroçado, assassinado e esquecido. O mínimo que este filme poderia fazer era trazê-lo de volta", diz Mariscal. "Ele não pode ser apagado da História. Foi grande demais em sua arte para isso ocorrer".

Muita gente boa da MPB conta suas versões do desaparecimento, da ausência e do talento dele, incluindo Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, João Donato (que nos deixou faz pouco). Cada uma dessas celebridades aparece em cena versões animadas, mas com suas próprias vozes.

"Fiquei fascinado com a entrevista do Ferreira Gullar, que traz um relato impressionante", conta Mariscal, sempre cheio de bom humor. "Cada depoimento carrega uma memória, o que nos exigia uma paleta diferente".