Dois anos depois de ter conquistado o troféu Redentor de Melhor Direção no Festival do Rio (em empate com Anita Rocha da Silveira, coroada por "Medusa"), por "A Viagem de Pedro", a cineasta paulista Laís Bodanzky regressa ao evento, agora presidindo o júri da Première Brasil. Ao lado dela estão, a diretora de arte e cineasta Renata Pinheiro; a atriz e escritora Isabél Zuaa; a diretora artística da Giornate Degli Autori, Gaia Furrer; e o produtor João Vieira Jr. Essa turma tem a tarefa de analisar 16 curtas-metragens, 13 longas de ficção e sete longas documentais. Na entrevista a seguir, a diretora, revelada com "Bicho de Sete Cabeças" (2000), conversa com o Correio da Manhã sobre a dimensão política de sua tarefa.
Qual é a relevância que a Première Brasil vem tendo na busca por novos veios estéticos?
Laís Bodanzky: Entendo que é um grande jogo de espelho. Na hora que a curadoria do festival faz uma seleção de um cinema independente brasileiro de autor, naturalmente já vem um cinema investigativo, de busca, de caminhos estéticos, de narrativas. É sempre com uma assinatura e um discurso muitas vezes engajado e reflexivo. Consequentemente, o público recebe essa seleção e o júri reflete a partir dali. É muito interessante esse processo porque, normalmente, o Festival do Rio é a primeira janela desse cinema no Brasil, quando não o é no mundo. É uma tradição que alguns filmes venham de sessões importantes em festivais fora do Brasil. Isso cria uma curiosidade muito grande para o público e para o júri que é o que vou viver agora nessa minha experiência. Estou muito curiosa e acho que vai ser muito interessante.
Qual foi a relevância do evento na carreira de "A Viagem de Pedro", seu longa mais recente, que saiu de lá com o Redentor de Melhor Direção e prêmio de Melhor Ator Coadjuvante?
Foi muito importante o filme ter passado pelo Festival do Rio e ter recebido os prêmios. Foi um ano difícil, ainda com o fim de pandemia, mas acho que, agora, o festival volta com sua força máxima. Naquele ano, não tínhamos convidados e existiam muitas restrições. Mesmo assim, o filme teve uma grande repercussão a partir do Festival do Rio, pela própria mídia que o evento atrai. Acho que o histórico do Festival é colocar ali um selo de qualidade e causar uma grande curiosidade. Vejo o Festival do Rio como um grande abre-alas para o lançamento. A estreia de "A Viagem de Pedro" veio nessa onda das premiações. Para o Sérgio Laurentino, que ganhou na categoria Melhor Ator Coadjuvante, a vitória foi muito importante na carreira dele. Esse reconhecimento é forte. É importante para o filme, mas também para os artistas e técnicos envolvidos no filme. Estar em um festival com o do Rio e ser reconhecido numa premiação faz uma grande diferença.
Estamos numa luta por aumento de cota de tela e de resgate do público. O que eventos como a Première Brasil e a Mostra de São Paulo (que inaugura sua edição n. 47 no dia 19) podem agregar nessa luta? E como você vê o engajamento de nosso cinema nessa peleja por visibilidade?
Os festivais, de uma forma geral, foram e continuam sendo esse pilar importante nesse momento de grande crise que o cinema passou na pandemia e essa demora em sua retomada. Boa parte tem a ver com a nossa falta de política cinematográfica, que é a dificuldade que a gente tem de manter os filmes em cartaz no meio de tantas produções de grandes estúdios, e da produção autoral de outros países. Os festivais cumprem essa função de ventilar, de colocar um holofote nessa nossa produção independente tão importante. De certa forma, recupera essa brincadeira do glamour. Nos festivais, você tem a chance de encontrar o autor do filme, cineastas, a equipe, elenco. É sempre importante estar perto nos debates. Cria um ambiente efervescente. Acredito que isso contribui para chamar atenção do público para que ele tenha esse desejo da volta. Esse desejo vem acontecendo. Tá acontecendo de forma mais lenta do que eu acho que a gente queria, e desejava, mas vem acontecendo.