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Morre Berta Loran, dama do humor brasileiro, aos 99

Berta Loran optou pelo recolhimento e negava pedidos de entrevistas | Foto: Divulgação

Aatriz e comediante Berta Loran morreu na madrugada desta segunda-feira (29), aos 99 anos, no Hospital Copa D'Or, em Copacabana, Rio de Janeiro. A morte da veterana intérprete marca o fim de uma das carreiras mais longevas do humor brasileiro, construída ao longo de mais de sete décadas nos palcos, no cinema e na televisão. O hospital informou o falecimento através de nota oficial, solidarizando-se com familiares, amigos e fãs, mas não divulgou detalhes sobre as circunstâncias da morte, respeitando a privacidade da família.

Nascida Basza Ajs em Varsóvia, no dia 23 de março de 1926, Berta chegou ao Brasil aos nove anos, quando sua família judaica fugiu da Polônia para escapar da perseguição nazista. A mudança forçada para o Rio acabaria se revelando o primeiro passo de uma trajetória artística que atravessaria gerações de telespectadores. Seu talento para a comédia manifestou-se precocemente, influenciado pelo pai, que era alfaiate e ator amador, acostumado a se apresentar para a comunidade judaica local.

"Eu sempre fui trapalhona, traquina, sapeca, danada. Com 14 anos, botei o salto alto da minha mãe e subi no palco. Quebrei o salto e saí mancando. O povo começou a rir. E eu gostei! Pensei comigo: 'o bom é fazer rir'", recordava a atriz em depoimento ao Memória Globo, resumindo em poucas palavras a descoberta de sua vocação cômica.

Essa primeira experiência nos palcos, aos 14 anos, definiria não apenas sua carreira, mas também sua filosofia de vida, expressa em uma de suas frases mais conhecidas: "Você pode perder apartamento, joia, dinheiro, e até um grande amor - 30 anos depois, quando você o reencontra, dará graças a Deus que o perdeu. Agora, o humor não pode ser perdido. Humor é tudo na vida".

A carreira profissional de Berta teve início no teatro carioca, mas foi interrompida temporariamente na década de 1940, quando se casou e se mudou primeiro para a Argentina e depois para Portugal, onde também atuou como atriz. De volta ao Brasil em 1950, já separada do primeiro marido, retomou a carreira com renovado vigor. Sua vida pessoal foi marcada por tentativas frustradas de maternidade - engravidou duas vezes durante o primeiro casamento, mas decidiu interromper as gestações devido às dificuldades financeiras e à relação conturbada. Posteriormente, em seu segundo casamento, tentou novamente ter filhos, mas uma infecção uterina a obrigou a se submeter a uma histerectomia.

A consagração nacional veio com a televisão. Berta ingressou na TV Globo em 1966 e rapidamente se tornou presença constante nos principais programas humorísticos da emissora. Participou de marcos da comédia televisiva brasileira como "Riso Sinal Aberto" (1966), "Balança Mas Não Cai" (1968), "Faça Humor, Não Faça Guerra" (1970), "Satiricom" (1973) e "Planeta dos Homens" (1976). Sua versatilidade cômica a levou também à "Escolinha do Professor Raimundo" (1990), "Zorra Total" (1999) e "A Grande Família" (2012), consolidando-se como uma das humoristas mais queridas do grande público.

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Com Ary Fontoura, Berta Loran viveu Frosina em 'Amor Com Amor Se Paga', um de seus papéis mais marcantes nos folhetins da TV Globo | Foto: Acervo TV Globo

Paralelamente ao trabalho em programas humorísticos, Berta construiu uma sólida carreira em telenovelas. Participou de produções como "Amor com Amor se Paga" (1984), onde interpretou Frosina ao lado de Ary Fontoura, "Guerra dos Sexos" (1983), "Cambalacho" (1986), "Torre de Babel" (1998), "Cama de Gato" (2010), a segunda versão de "Ti-Ti-Ti" (2011), "Cordel Encantado" (2011) e "Ciranda de Pedra" (2008). Seus últimos trabalhos televisivos foram no humorístico "Vai Que Cola" (2018) e na novela "A Dona do Pedaço" (2019), encerrando uma carreira que acompanhou praticamente toda a história da televisão brasileira.

A vida amorosa de Berta foi igualmente intensa. De 1990 a 2016, foi casada com o cantor Paulo de Carvalho, relacionamento que durou 26 anos. Em 2017, aos 91 anos, surpreendeu a todos ao se casar pela quarta vez, desta vez com Claudionor Vergueiro, demonstrando sua vitalidade e capacidade de reinvenção mesmo na idade avançada.

Nos últimos anos, a atriz optou pelo afastamento gradual dos holofotes e do convívio social. Segundo o autor João Luiz Azevedo, que escreveu "Berta Loran: 90 anos de humor" (Litteris, 2016), ela recusou sistematicamente convites para entrevistas e aparições públicas. Produções como "The Noite", de Danilo Gentili, e "Sem Censura", da TV Brasil, comandado por Cissa Guimarães, tentaram sem sucesso estabelecer contato com a veterana atriz que preferiu sair de cena em discrição.