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Vozes da diáspora negra nas Américas

As raízes tanto da música brasileira quanto da música norte-americana estão nos cantos de pessoas negras escravizadas que entoaram canções como forma de preservar suas culturas e como potentes mecanismos de sobrevivência e resistência. Inspirados por essa origem musical comum ao Brasil e aos Estados Unidos, Sérgio Pererê e Alissa Sanders conceberam o projeto "Vissungos e Spirituals: Vozes Ancestrais Negras das Américas", atração do Centro Cultural Banco do Brasil neste fim de semana.

"Vozes Ancestrais" dá nome ao show que celebra um encontro entre os cantos do Vissungo (cantigas em língua africana ouvidas outrora nos serviços de mineração e ainda hoje presentes em diversas situações da vida cotidiana dos habitantes de alguns povoados de Minas Gerais) e dos Reinados de Minas (manifestações culturais e religiosas que celebram a devoção a Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia e que também relembram tradições da religiosidade africana), que marcam a trajetória artística e pessoal do cantor e multiartista mineiro Sérgio Pererê, com os spirituals, cantos de trabalho e folclóricos presentes na história dos escravizados negros norte-americanos.

Em ambos os casos, as músicas ecoadas pelos ancestrais de Alissa e Pererê, seja no ciclo do ouro de Minas Gerais ou nas lavouras americanas, carregam um peso afetivo em comum. "Os cantos do vissungo e dos spirituals são o jeito de viver africano. A partir da filosofia Bantu, existe uma herança africana que diz: 'para tudo se canta'. Não é apenas para trabalhar que se canta, se canta para comer, para dormir, para agradecer, para xingar. Para tudo", explica Pererê.

Ao mesmo tempo, as músicas também estão repletas de códigos de sobrevivência, usados como estratégia de fuga e proteção do povo negro. "Os negros e negras escravizados foram obrigados a aprender a Bíblia. E tiraram das histórias do povo israelita muitas coincidências com as suas histórias. Há cantos sobre a abertura do Mar Vermelho por Moisés, que é uma referência para fugir. Há canções que mencionam um lugar seguro com luz na janela, e era um código que indicava que essas casas abrigavam pessoas em fuga", revela Alissa.

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