Três dias após da notícia da histórica conquista do prêmio de melhor atriz para Fernanda Torres, pelo trabalho no longa ‘Ainda Estou Aqui’, dirigido por Walter Salles, populares e intelectuais de Volta Redonda comentam o fato. O filme retrata endurecimento da ditadura militar, na década de 1970. No Rio de Janeiro, a família Paiva - Rubens, Eunice e seus cinco filhos – veem, um dia Rubens Paiva é levado por militares à paisana e desaparece. O drama, premiado levou fez alguns intelectuais de Volta Redonda, ressaltarem a memória de fatos ocorridos em Volta Redonda, durante a ditadura e destacarem a importância da arte literatura e da arte.
- A conquista do Globo de Ouro de melhor atriz é bastante significativa para a Arte brasileira em diferentes dimensões. Fernanda, sendo mulher, e esta mulher, concorreu com outras ícones da dramaturgia mundial e venceu pela atuação, não sei se melhor, mas fortemente engajada numa história real que marcou tantas outras mulheres silenciadas naquele momento horroroso, e depois, da história do Brasil. A vitória da atriz coloca o filme na história da Arte brasileira e com isso, oficializa o entendimento de que a Ditadura foi uma realidade no país e estabelece um certo modo de ver aquele momento. Por fim, fica claro - a Arte tem papel fundamental para a revisão da realidade, sobretudo num momento de negação da história e tentativa de implantação de narrativas que anulam as identidades de pessoas que lutaram para que a democracia que experimentamos hoje pudesse acontecer - declara Alexandre Batista da Silva, doutor em língua Portuguesa pela UFRJ, professor na UFB e UERJ.
- O grande feito foi fazer de um filme autoral um filme popular, isto é, com muita bilheteria e competindo com filmes estrangeiros em cartaz, que por sinal, é uma competição desleal: para cada filme nacional em cartaz temos quatro estrangeiros. Ganhar ou não o Oscar deveria ser uma questão menor, o cinema nacional é reconhecido e admirado mundialmente pelos críticos de cinema desde do movimento Cinema Novo, alavancado por Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman, Miguel Borges e Marcos Farias e claro, Glauber Rocha. Quanto ao tema do filme de Walter Salles, a ditadura militar no nosso país, é sempre necessário insistir e voltar a esse tema, já que por aqui, a memória não é devidamente cultuada e os responsáveis não foram punidos, diferente de países como Chile e Argentina...Para nós, voltaredondenses o tema do filme também nos toca por conta de tudo que passamos, na chamada ditadura tardia, durante a greve de 1988...É preciso aproveitar desses momentos de euforia para celebrarmos nossa cultura, nossos artistas, celebrar sempre, e estar atento, vigilante e claro, cultuar a memória para que nunca mais os horrores da ditadura possam se repetir - diz Leandro Pacheco, Mestre em Artes Visuais pela UFRJ.
- O filme "Ainda estou aqui" é muito importante pois discute um problema que ainda não está bem resolvido no Brasil: a questão dos desaparecidos políticos. Ainda temos cerca de 210 pessoas que se encontraram nessa situação, gerando ainda sofrimento para essas famílias, que não tiveram nem o direito de enterrar seus mortos. Direito que a ditadura lhes negou e que Lei da Anistia (1979) não resolveu. O filme também é importante porque retrata os males que a ditadura provoca, como ela maltrata as pessoas, destrói sonhos, vidas e famílias. Difícil não se emocionar com o filme, ele nos sensibiliza para essa questão, essa e a função social da arte. E faz isso em um momento em que grupos políticos de extrema-direita defendem a volta de uma ditadura, e tentaram um golpe para isso. O filme fortalece a luta pela democracia e pela apuração dos crimes da ditadura, e faz isso de maneira muito delicada, envolvendo a população nessa discussão - afirma Paulo Célio, doutor em História pela UFRJ e professor na UGB.
- Foi impossível não me emocionar ao ver a premiação de Fernanda Torres... A capacidade comunicativa que a dramaturgia tem, através do texto e da interpretação cênica, levam a riquezas de leituras, caminhos que sensibilizam o público sobre histórias essenciais, como a dessa mãe, que se tornou solo com o assassinato do marido, que enfrentou o poder instituído apesar de sua idade, de sua maternidade, de sua necessidade de formação - construída no decorrer de sua luta. E toda essa história, possibilitada pela única mulher a presidir o Brasil e vítima da brutalidade da ditadura, foi escrita por um dos mais representativos escritores da minha juventude, um jovem que me introduziu no mundo das pessoas com deficiência e me apresentou intimamente a literatura contemporânea - conclui Abigail Ribeiro, doutora em Literatura e professora no MEP.
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