Por: Redação

Fiocruz conclui projeto de transição agroecológica

Ana Cristina é agricultora do Bonfim e participou da produção agroecológica | Foto: Brenda Spinosa

O projeto de transição agroecológica para promoção da saúde da Fiocruz, que buscou desenvolver ações de apoio para o combate à fome e uma alimentação saudável, foi concluído no início deste mês de abril em Petrópolis. O encerramento contou com um evento no Parque Nacional Serra dos Órgãos (Parnaso) e reuniu cerca de 70 pessoas, incluindo representantes das comunidades e participantes das várias atividades desenvolvidas pelas equipes do Fórum Itaboraí: Política, Ciência e Cultura na Saúde, programa da presidência da Fiocruz em Petrópolis, e da Agenda de Saúde e Agroecologia da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS).

Com início em junho de 2022, o Transição Agroecológica faz parte de uma iniciativa mais ampla, o projeto Ará, que tem como objetivo o desenvolvimento sustentável e a promoção da saúde em populações fragilizadas e comunidades tradicionais.

Na atuação em Petrópolis, o Transição Agroecológica contou com a parceria do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e da Associação dos Produtores Biológicos do Estado do Rio de Janeiro (ABIO). As ações do projeto foram focadas nos territórios do Brejal e Bonfim, regiões rurais da cidade, mas houve impacto também em áreas urbanas, como Corrêas, Alto da Serra e a comunidade do Contorno na BR-040.

Durante o projeto, o MPA, além de buscar alternativas para reduzir o uso de agrotóxicos nas produções de verduras e hortaliças do Bonfim, estruturou uma rede que abrangeu o planejamento, preparação e logística eficiente para distribuição de cestas com alimentos agroecológicos. Ao todo, foram distribuídas 1.600 cestas para as famílias em vulnerabilidade identificadas pelo projeto.

Este número inclui os sacolões populares, onde as famílias em insegurança alimentar - principalmente da região do Alto da Serra, a mais impactada pelas chuvas de 2022 - tiveram acesso a alimentos agroecológicos e puderam montar sua própria cesta com alimentos in natura. O projeto também forneceu insumos para a operacionalização de uma cozinha solidária na Escola Municipal Leonardo Boff, na Comunidade do Contorno.

"A agroecologia é uma das principais estratégias para a promoção da saúde já que contribui para dar sustentabilidade e versatilidade à produção familiar de alimentos, contribuindo para combater a fome ao mesmo tempo que reduzindo o uso de insumos químicos com impacto prejudicial reconhecido sobre a saúde das pessoas", diz Felix Rosenberg, diretor do Fórum Itaboraí / Fiocruz.

Thiago Alves, coordenador do projeto pelo Fórum Itaboraí, diz que a ideia foi unir esforços para aproximar as populações das zonas rurais e urbanas de Petrópolis em torno do direito humano à alimentação adequada e dos princípios agroecológicos que promovem saúde para a população em geral, tanto do campo quanto da cidade. "Além disso, outro ganho da parceria foi a reaproximação dos movimentos sociais junto ao município, no sentido de realizar ações que sejam de interesse público dentro da temática da alimentação, atuando sobre os sistemas alimentares locais, inclusive propondo e criando outras formas de produção, comercialização e consumo, mais justas e sustentáveis", disse.

Cristina Ribeiro, diretora da ABIO, parceira na articulação com os agricultores do Brejal, destaca a importância de um pensamento voltado para a agricultura orgânica, que tem a agroecologia como base. "Todos os agricultores associados à ABIO e certificados pelo SPG-ABIO estão em permanente transição agroecológica, ou seja, buscando incorporar cada vez mais agroecologia aos seus sistemas produtivos. E eles são referência em conhecimento agroecológico e no enfrentamento dos seus desafios na prática", disse.

O projeto de transição agroecológica teve também a parceria da ASPTA Agroecologia e Agricultura Familiar; da Embrapa Agrobiologia; e do Parnaso. Fomentou ainda a aproximação de movimentos sociais mediante o apoio do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Movimento das Comunidades Populares (MCP), Unidade de Saúde da Família, Rede Bonfim Verde, AUÁ Hostel e CEI Therezinha de Jesus Lima, por meio da Secretaria Municipal de Educação de Petrópolis.

Produção agroecológica

O incentivo à produção agroecológica de alimentos para o fortalecimento da economia local, consolidando um sistema alimentar de abastecimento popular em Petrópolis, foi um dos eixos norteadores do projeto.

Ana Cristina Pimenta Coelho é agricultora do Bonfim e revelou que nem imaginava que era possível ter um alimento bonito e cultivado sem agrotóxicos. "Eu jamais imaginaria que sem veneno eu ia colher uma cebolinha tão boa quanto eu colhi daquela época. Tem gente que fica assim: 'não usa veneno, não colhe nada'. Não é assim. Não vai botar agrotóxico e largar pra lá. Você tem que substituir o agrotóxico por alguma coisa que vai combater aquela praga", diz.

Para auxiliar nessa transição, foram realizadas na região do Bonfim formações de produção de bioinsumos, focada em práticas agroecológicas e técnicas de aperfeiçoamento do plantio camponês. No local, foram desenvolvidas alternativas de adubação e possibilidades para controle de pragas e doenças com menor custo a partir da matéria prima que é encontrada no próprio território, como bokashi - matéria orgânica fermentada - uma técnica de adubação orgânica com ingredientes de origem vegetal e/ou animal; a utilização de biofertilizantes e "água de vidro".

"A utilização de bokashi faz parte das ações que visam a nutrição das plantas, o fortalecimento delas e as boas práticas da agroecologia. O caminho da transição agroecológica passa pela mudança dos agroecossistemas e pode acontecer de diversas formas e com etapas superpostas, que requerem posturas no planejamento, mas principalmente em seu campo prático de manejo", explica a engenheira agrônoma e consultora do projeto Andresa Paiva, do MPA.

O projeto de transição agroecológica atuou também nos eixos de comercialização, combate à fome e articulação comunitária. Na parte de comercialização, buscou formar circuitos curtos, desenvolvendo formas de escoamento dos alimentos produzidos no território diretamente para consumidores do município. Já o último eixo, concentrou-se no abastecimento de alimento agroecológico comunitário, a partir da identificação de famílias em situação de insegurança alimentar.

Técnica em agropecuária e também consultora do projeto, Jeniffer Carmo diz que a cozinha solidária na Comunidade do Contorno, com apoio do MCP, se constitui como um legado do projeto e que terá o objetivo de dar continuidade ao oferecimento de alimentos nestes territórios em situação de insegurança alimentar.

Claudemar Mattos, da Agenda de Saúde e Agroecologia da VPAAPS, destaca que as ações desenvolvidas no Brejal e no Bonfim tiveram como base um estudo ecológico e econômico de agroecossistemas por meio do Método Lume, que possibilitou que as Equipes da VPAAPS e do Fórum Itaboraí, junto com as agricultoras e agricultores, dessem visibilidade tanto às potencialidades quanto às fragilidades e às ameaças que condicionam o modo de vida das famílias. "Com isso, foram planejadas as ações subsequentes referentes à valorização das sementes locais, apoio à organização das mulheres, oficina de bioinsumos, avicultura e comercialização com foco no abastecimento popular de alimentos", afirma.

De acordo com ele, a autonomia e a integração social de algumas famílias de agricultores em Petrópolis são limitadas pelo acesso à terra, que vai desde a falta de terra para plantar a ameaças à posse de áreas de roça, que geram consequências negativas, pois fragilizam o manejo agroecológico da fertilidade do solo, a produtividade e a produção de mudas.

Durante o evento de encerramento do projeto, as famílias que participaram do estudo do LUME receberam, em forma de fichário, a análise realizada, que é composta pelo registro da memória de toda trajetória daquele núcleo familiar e da área de produção,visualizando tanto as potencialidades, quanto os caminhos para maior autonomia e integração social.