Coluna Magnavita | As guerras simultâneas de André Esteves - Parte I

Controle do setor de combustíveis e o fim do Master custe o que custar

Por Cláudio Magnavita

André Esteves

Controle do setor de combustíveis e o fim do Master custe o que custar

No livro A Arte da Guerra, um dos principais ensinamentos de Sun Tzu é: “evite a força e ataque a fraqueza” e a importância da concentração de forças e da logística, alerta implicitamente contra a dispersão de recursos em várias frentes. O banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, abriu, nas últimas semanas, duas frentes de con itos que o colocam na berlinda.

A primeira é a do Banco Master, capaz de promover dois grandes conflitos envolvendo os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Já a segunda, acabará refluindo para os mesmos personagens e abrindo um perigoso flanco, o seu avanço na área de energia, especialmente na distribuição de combustíveis.

Não há em Brasília, especialmente, no Ministério da Fazenda, quem não encontre sinais das digitais de André Esteves na operação contra Ricardo Magro e a Refit. O posicionamento público e publicado do ministro Fernando Haddad contra a refinaria mudou enquanto avançam as investigações. O ministro, que, em alguns círculos mais fechados, já é chamado de Fernando “Esteves”, começou alegando relação da Refit com o crime organizado, tese que ruiu ao se constatar que Magro era quem mais denunciava o avanço do PCC no setor e que, muitas vezes, as suas denúncias convergiam com a do Instituto Combustível Legal (ICL). Depois, foi acusado de sonegador, tese que ruiu ao constatar que não havia sonegação, e sim conflitos jurídicos nos pagamentos de impostos. Agora, o rótulo é de evasão de divisas. Nesta cruzada, as operações da Re t foram colapsadas: mais de R$ 200 milhões em combustíveis foram para os tanques da Petrobras. Esta espécie de faxina resultou no aumento do litro de combustível vendido para a rede de postos de bandeira branca, aumentando, consideravelmente, a receita das irmãs que sustentavam o ICL, ou seja, Shell (Raízen), Ipiranga e BR Distribuidora (Vibra).

Mas o que o banqueiro André Esteves tem com esta história? A resposta positiva é compreendida quando se resgata a recente aquisição de uma grande posição da COSAN, a controladora da Raízen e o seu interesse público na Vibra, já fruto de uma oferta anterior.

A confluência das duas frentes abertas por André Esteves, a do Master e Combustíveis, se encontram no STF. É só fazer uma viagem recente aos anais da Lava Jato.

No seu livro “33 Estratégias de Guerra”, Robert Greene transforma a sabedoria militar em lições práticas e aplicáveis a diversos contextos, incluindo política e negócios. O autor explora várias estratégias e táticas, usando exemplos históricos de sucesso e fracasso. A análise de Greene, sobre como evitar a dispersão e manter o foco em objetivos claros serve como um alerta sobre o risco de batalhas em múltiplas frentes, não deve ter merecido uma leitura atenta de André Esteves.

A confluência combustíveis, STF e Lava Jato

A trajetória de Esteves no setor de energia não é isenta de polêmicas, principalmente devido ao seu envolvimento (e do BTG) em casos investigados pela Operação Lava Jato.

Em 2015, André Esteves ficou preso preventivamente por 20 dias por tentar obstruir as investigações da Lava Jato. As apurações envolviam, entre outros pontos, a tentativa de evitar a delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

Embora tenha enfrentado sérias acusações e a publicidade negativa, a defesa de Esteves contestou as medidas e inquéritos contra ele. Em 2021, por exemplo, o ministro do STF Gilmar Mendes trancou um inquérito da Lava Jato que tramitava contra o banqueiro.

Esteves foi preso preventivamente por supostamente conspirar com o então senador Delcídio do Amaral para oferecer R$ 4 milhões a Nestor Cerveró (ex-diretor da Petrobras) em troca de seu silêncio. Em sua delação premiada, Cerveró afirmou que Esteves pagou R$ 6 milhões em propina a Collor para viabilizar que postos de combustíveis de uma rede ligada ao BTG Pactual adotassem a bandeira da BR Distribuidora.

Após passar cerca de 20 dias detido, ele foi liberado para prisão domiciliar em dezembro de 2015. Em 2018, Esteves foi absolvido das acusações de obstrução de justiça por falta de provas, após o Ministério Público Federal pedir a sua absolvição. Bem diferente de Fernando Collor, que hoje encontra-se em prisão domiciliar por questões humanitárias. Ele foi condenado pelo STF em 2023 a 8 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, sentença mantida após recursos julgados em 2024. A condenação refere-se ao esquema na BR Distribuidora que envolvia a influência política do ex-presidente em contratos da estatal.

A rede de postos envolvida no esquema entre André Esteves e Fernando Collor era a DVBR (Derivados do Brasil S/A) formada a partir da aquisição de redes menores pelo BTG Pactual, como a Via Brasil e a Aster.

A negociação investigada envolvia o "bandeiramento" (troca de marca) de 120 postos de combustíveis, localizados principalmente no estado de São Paulo. Além de André Esteves, a empresa tinha como sócio o empresário Carlos Alberto de Oliveira Santiago.

O objetivo era fazer com que esses postos independentes passassem a exibir a bandeira da BR Distribuidora (atualmente Vibra Energia), garantindo contratos de fornecimento e exclusividade com a estatal.

Esse contrato de embandeiramento foi assinado em 2011 e tornou-se um dos pilares da investigação sobre a influência política de Collor na subsidiária da Petrobras. Na BR, está Pedro Paulo Leoni Ramos também condenado.

No julgamento do STF que condenou Collor e Leone Ramos pelos negócios da BR Distribuidora e UTC, o Tribunal absolveu os réus das acusações de corrupção em contrato de troca de bandeira de postos de combustíveis entre a BR Distribuidora e a DVBR – Derivados do Brasil S/A em 2011, e em contrato de gestão de pagamentos e programas de fidelidade. Os autos do processo revelam porém a cuidadosa investigação promovida pelo Ministério Público e a coleta de provas. O julgamento ocorreu sem que a mídia percebesse quem eram os acionistas dos 120 postos na época da investigação.

O sócio de Esteves nos Postos, um Epstein brasileiro

Uma década antes de André Esteves se tornar sócio de Carlos Alberto de Oliveira Santiago, um escândalo similar ao do financista norte-americano Jeffrey Epstein envolvia o futuro parceiro do BTG. Em 1997, Santiago foi preso preventivamente e denunciado pelo Ministério Público sob acusação de corrupção de menores e formação de quadrilha. Segundo as investigações da época, ele foi acusado de aliciar adolescentes e "encomendar" meninas para fins de exploração sexual em São Paulo. Foi um escândalo que abalou o setor de combustíveis e ficou longe do radar de compliance do Banco.

Como proprietário da Aster Petróleo, Santiago foi alvo frequente de investigações sobre sonegação de tributos e adulteração de combustíveis.

Em 2015, na Operação Politeia (desdobramento da Operação Lava Jato), a Polícia Federal apreendeu cerca de R$ 3,67 milhões em espécie em um cofre na sede de sua empresa em São Paulo.

Como o UOL publicou em 14 de julho de 2015, “O maior montante apreendido - R$ 3,67 milhões - estava em um 'cofrão', conforme definição dos agentes, no escritório do empresário Carlos Alberto Santiago, o Carlinhos, dono da rede de postos de combustíveis Aster Petróleo. Ele é suspeito de ter intermediado propina de 1% para Collor sobre um contrato de R$ 300 milhões na BR Distribuidora. Carlos Alberto teve três endereços vasculhados pela PF nesta terça-feira. Em 2002, ele foi citado na CPI dos Combustíveis da Assembleia Legislativa de São Paulo.”

Carlos Alberto de Oliveira Santiago morreu em 2016 em decorrência de problemas de saúde. A sua família vendeu parte dos negócios, transformado pelos novos acionistas no grupo Copape, com os atuais sócios foragidos e acusados de serem o braço do PCC no setor de combustíveis .

BTG pode ter o controle do setor de distribuição de combustíveis

Já André Esteves, abre, agora, duas frentes de batalha: uma para sepultar qualquer chance de sobrevida do Banco Master, custe o que custar; na outra, vira o principal acionista da Cosan e passa a dar as cartas na Raízen. Foca agora na aquisição da VIBRA, depois da recusa de fusão feita pela Eneva, braço de energia do BTG, só que, no portfólio do banqueiro, não incluía a Shell/Raízen. Este cenário não apaga, porém, o passado radioativo da sua incursão desastrada no setor de combustível e nem a sociedade com o “Epstein” brasileiro. Esteves abriu, simultaneamente, duas frentes de luta. Na sua conta, estão sendo creditados os ataques a dois ministros do STF, apesar de, ironicamente, ter o ex-ministro do Supremo Nelson Jobim responsável por Relações Institucionais e Políticas de Compliance do banco. As críticas têm passado do limite e formado um espírito de corpo na Corte, que passou a ter a sua dignidade e respeitabilidade questionada de forma intensa, especialmente por veículos ligados societariamente, ou subordinado, ao sistema financeiro. Os ensinamentos de Sun Tzu estão fazendo falta ao banqueiro.

Parte II - Na próxima edição da Coluna Magnavita a atuação da Raízen e a história da fusão da ENEVA e VIBRA.