Coluna Magnavita | Mudanças em licitação de limpeza urbana de cidade do interior têm indícios de ser direcionada

O grupo União Norte e empresas coligadas acumulam um histórico de denúncias de superfaturamento, direcionamento e corrupção em diversos municípios fluminenses

Por Cláudio Magnavita

Mutirão de limpeza na área central do município. A ação incluiu varrição, recolhimento de lixo, terra e uma grande lavagem em trechos da rua principal, desta vez, o foco foi preparar o Centro da cidade para receber, com mais conforto e bem-estar, os moradores e visitantes que prestigiaram o o tradicional desfile de 7 de setembro.

SUJEIRA NO LIXO  Uma mudança considerada suspeita e curiosa marcou a licitação milionária da Prefeitura de São Francisco de Itabapoana para os serviços de limpeza urbana. O primeiro edital, publicado em fevereiro, previa a contratação pelo valor de R$ 9,8 milhões. Poucos dias depois, o certame foi suspenso sob a justificativa de "adequações técnicas".

Quando o novo edital veio a público, o valor estimado saltou para R$ 14,4 milhões — um aumento de 47% — e trouxe uma série de novas exigências que restringem a participação de empresas. Entre elas, a inclusão do requisito de atestado para trituração de entulho (RCC), um serviço acessório que pouco se relaciona com a atividade-fim da contratação, mas que, na prática, apenas uma empresa da região tem condições de comprovar.

Além disso, foi mantida a proibição de consórcios, medida que já foi rechaçada em decisões anteriores do Tribunal de Contas e da Justiça em licitações de municípios fluminenses por reduzir a competitividade. Também foram ampliadas as exigências de qualificação técnica, como tempo mínimo de experiência e necessidade de certidões específicas junto a órgãos ambientais.

Essas alterações reforçaram a suspeita de que a concorrência estaria direcionada ao grupo União Norte Fluminense, que historicamente detém contratos semelhantes em cidades da região e já possui atestados de trituração de RCC.

HISTÓRICO E IRREGULARIDADES 

O grupo União Norte e empresas coligadas acumulam um histórico de denúncias de superfaturamento, direcionamento e corrupção em diversos municípios fluminenses: Macaé - Contratos de limpeza urbana firmados com a União Norte foram alvo de apontamentos por superfaturamento milionário, com sobre preços identificados em auditorias do Tribunal de Contas; Quissamã - Em 2017, o TCE-RJ apontou sobre preço de 666,57% em contrato firmado com a União Norte, classificando o valor como desproporcional e lesivo ao erário; Conceição de Macabu (2025) - A prefeitura lançou edital de limpeza urbana com exigências semelhantes às agora vistas em São Francisco de Itabapoana: vedação de consórcios, atestados de difícil obtenção e cláusulas restritivas. O Tribunal de Contas interveio, determinando ajustes por considerar que o certame restringia a concorrência e poderia estar direcionado; Operação Calicute - O executivo Marcos Andrade, irmão de Rafael Andrade (atual administrador da União Norte), firmou acordo de delação premiada em que revelou o pagamento de propina a conselheiros do TCE-RJ para facilitar contratos públicos de empresas ligadas ao grupo.

Esse conjunto de fatos reforça o padrão de atuação: elevação dos valores licitados, exigências técnicas restritivas e vínculos com práticas investigadas por corrupção.

DENÚNCIA AO MP E AO TCE 

No caso específico de São Francisco de Itabapoana, uma denúncia já foi protocolada junto ao Ministério Público e ao TCE-RJ, relatando as alterações do edital, o aumento expressivo de quase 50% no valor e a inclusão de cláusulas restritivas que favorecem diretamente a União Norte.

PRINCÍPIOS VIOLADOS 

Especialistas em direito público destacam que, ao moldar um edital sob medida para uma única empresa, a Prefeitura pode ter violado princípios constitucionais como a isonomia, a impessoalidade e a ampla competitividade, previstos na Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021).

Enquanto o processo segue em análise, cresce a pressão para que os órgãos de controle apurem se a licitação da limpeza urbana em São Francisco de Itabapoana representa apenas mais um episódio em uma longa série de práticas que beneficiam o grupo União Norte, em prejuízo da concorrência e, sobretudo, dos cofres públicos.