Por: Fernando Molica

As razões de Eduardo Bolsonaro para ser radical

Eduardo Bolsonaro sabe que o movimento liderado por seu pai precisa do embate | Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

A postura radical do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) faz sentido: ele, seu pai e seus irmãos temem uma diluição do bolsonarismo na geleia geral da política brasileira.

Isso comprometeria a identidade da extrema-direita no sempre bem-servido prato feito que mistura altas doses de patrimonalismo com leves temperos de conservadorismo — de ismo em ismo, o Centrão enche o papo. Eduardo também briga com irmãos e madrasta pelo espólio eleitoral do pai.

O bolsonarismo é radical, excludente, violento e que precisa de inimigos, reais ou imaginários, bem definidos (Paulo Freire, Lei Rouanet, globalismo, petismo). Assim como outros movimentos semelhantes gerados a partir do início do século XX, não foi criado para oferecer uma perspectiva de pacificação ou de composição, mas para brigar.

Para sobreviver e crescer, tem que rejeitar a conciliação. Precisa da tensão, do ódio, de um estado permanente de luta. Tem necessidade de cultivar o medo em relação ao outro, o diferente. Daí o encaixe do bolsonarismo com a lógica religiosa cristã, de luta do bem contra o mal, de Deus contra o diabo — não há MDB que consiga articular acordo de convivência entre estes dois opostos.

Na Presidência, para garantir que não seria deposto e para se livrar da trabalheira do cargo, entregou a administração para o Centrão, mas manteve o controle da cara do governo. Deixou que os aliados fizessem suas farras na Codevasf e se lambuzassem com as emendas, mas foi rígido com temas capazes de traduzir seu jeito de interpretar o mundo. Foi assim na parceria com o coronavírus, na transformação da Polícia Rodoviária Federal numa espécie de milícia pessoal.

A implicância de Eduardo com Tarcísio de Freitas (Republicanos), faz, assim, todo o sentido. Eleito graças à bênção de Jair Bolsonaro, o governador de São Paulo busca representar uma versão moderada do movimento capitaneado pelo ex-presidente, como se fosse possível traçar uma reta meio curva. Faz carinho na Faria Lima ao mesmo tempo que mantém o fornecimento de carne crua para as multidões ávidas de sangue.

Diferentemente do PT, que sempre buscou se mostrar confiável ao que se convencionou chamar de "sistema", o bolsonarismo precisa manter sua fama de não domesticável. Nisto, tem uma vantagem: até por ser um movimento de direita, comprometido com o capitalismo, sobre ele não pairam suspeitas de socialização dos meios de produção.

Para ganhar eleições, o sindicalista Lula aparou a barba, passou a usar ternos elegantes; a guerrilheira Dilma Rousseff emagreceu, fez harmonização facial, modernizou penteado e optou por óculos de armação mais leve. Para conquistar maioria no Congresso, o PT abriu mão do discurso de cobrança de honestidade que levara Leonel Brizola a chamá-lo de UDB de tamanco e macacão. A convivência com o lado podre da política cobrou seu preço até mesmo no PT, teve gente que, de tanto brincar de princesa, acostumou na fantasia.

O problema do bolsonarismo é outro. O grupo não está nem aí para as estrepolias do PL-raiz, para a contabilidade criativa que caracteriza o Centrão — vale tudo, desde que o núcleo ideológico seja preservado.

Apesar da aproximação com igrejas evangélicas, desde sempre caracterizadas pela descentralização, o bolsonarismo atua mais como o Vaticano e suas doutrinas rígidas e inegociáveis — sua Bíblia não admite interpretações.

Na dúvida, manda para a fogueira adversários ou aliados que costeiam o alambrado. Numa dessas, pode se queimar feio, mas isso é do jogo. O que não quer é perder o fogo, propriedade de um determinado mito que não pode ser compartilhada com mortais.