Os pífios resultados do Ideb, índice que mede a aprendizagem do ensino básico, revelam o sucesso de uma política secular de exclusão que vem sendo executada com muito zelo pelas elites brasileiras. O fracasso da maioria dos estudantes revela o sucesso de quem fatura com a pobreza e não admite mudanças.
Não é por falta de dinheiro que a educação brasileira — especialmente a pública — é, com as exceções de praxe, tão ruim. Só este ano, o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) deverá transferir R$ 287,4 bilhões para estados e municípios.
O descompasso entre o investimento e os resultados indica também a possibilidade de aplicação incorreta e/ou de desvio de verba. Para quem fatura alto com o dinheiro da educação é melhor mesmo é que crianças do quinto ano continuem sem saber — como revela o Ideb — somar moedas de R$ 0,25 ou de R$ 0,50. Quem não sabe fazer contas tem mais dificuldade de apurar o dinheiro público roubado.
Como em qualquer outra área, a massiva aplicação de recursos em educação deveria gerar melhorias evidentes, relevantes. Para efeito de comparação, é como se pontes e hospitais construídos com dinheiro público desabassem antes mesmo de ficarem prontos.
A tragédia da educação brasileira tem que ser investigada da mesma forma com que seria encarado uma falha grotesta que levasse a um acidente grave numa usina nuclear ou a um colapso numa hidrelétrica. É preciso que cada governador, prefeito e secretário de educação sejam cobrados, responsabilizados, processados, punidos.
A educação pública representa 80,7% das matrículas da primeira fase do ensino fundamental e 83,7% dos alunos da segunda etapa, até o nono ano. Só a vontade de impedir a ascensão social de tanta gente e a roubalheira explicam a incapacidade do país de oferecer uma educação de qualidade à grande maioria da população.
A implementação de pautas diversionistas e de viés conservador contribuiu, nos últimos anos, para piorar o que já era ruim. Fantasias ligadas a supostos estímulos ao comunismo, ao ateísmo e a práticas sexuais ocupam preocupações de pais e mães de alunos que sequer conseguem aprender a escrever e a fazer cálculos simples.
Esse desvio de objetivos não é estimulado por acaso, faz parte do mesmo processo que alimenta a exclusão e o ódio. O importante não é cobrar uma educação de qualidade, que inclua o necessário estímulo a um pensamento crítico, mas demonizar Paulo Freire e garantir que o professor de história não vai chamar de ditadura a ditadura que houve por aqui.
Não é fácil construir uma educação de qualidade. É difícil conseguir convencer alunos de que a escola é um caminho decisivo para a melhoria de suas vidas, que há um sentido naquilo que é ensinado. É complicado competir com as tentações mundanas, com a intenet que brilha no celular, com as promessas de dinheiro fácil. Professores sofrem para conseguir atenção e, mesmo, respeito por parte de alunos que com frequência despejam nas escolas a raiva e a frustração geradas pela pobreza, pelo racismo, pela falta de perspectivas.
Cabe ao poder público a tarefa de seduzir tantos milhões de jovens, e para isso não vale fazer promessas. É preciso fazer o básico, criar e manter escolas atraentes, contratar professores que tenham remuneração equivalente ao tamanho da responsabilidade que carregam. Não dá mais para conviver com desvios de merenda, com imbecis especialistas em vigiar livros e em colocar dedo na cara de professores.
Os resultados do Ideb mostram que uma boa educação não depende do grau de riqueza de um estado ou município: das 25 cidades com maiores notas no último ano do ensino fundamental, 21 ficam no Nordeste, 13 delas no Ceará. Temos bons exemplos a seguir.