Por: Fernando Molica

Negócio suicida da China

É inegável que uma boa parcela de brasileiros consegue se vestir graças a compras em lojas lá do outro lado do mundo, que chegam aqui muito baratas. | Foto: Divulgação

A tentação de comprar produtos por até um terço do preço em sites chineses é grande e levanta boas conversas sobre carga tributária brasileira, eficiência dos gastos públicos. São válidas as discussões relacionadas ao tamanho do Estado e o das mordidas que os impostos dão em nossos rendimentos — mas, infelizmente, é impossível imaginar que uma sociedade possa existir sem ser financiada pelos próprios cidadãos.

É inegável que uma boa parcela de brasileiros consegue se vestir graças a compras em lojas lá do outro lado do mundo, que chegam aqui muito baratas. O problema é que isso colabora para despir parte significativa da nossa economia; diminui a circulação de dinheiro, acaba com muitos empregos. No limite, diminui a renda do país, de todos nós, é quase um suicídio.

É razoável que, ainda mais em ano eleitoral, deputados e senadores resistam a aprovar a volta da incidência de impostos federais sobre compras de até US$ 50 dólares (R$ 260) feitas, principalmente, em sites chineses. Temem a reação dos eleitores que, de uma hora pra outra, ficarão privados da possibilidade de comprar uma camiseta por R$ 25, um vestido por R$ 60, uma mochila por R$ 30. Dá até para imaginar o sujeito reclamando com a deputada ou deputado: "Você acha mesmo que a mochila do meu filho ia quebrar o Brasil?". 

Uma mochila não quebra um país, mas 82 milhões delas pesam bastante; assim como 232 milhões de  de meias-calças e meias e 47 milhões de unidades de brinquedos , 10 milhões de blusas femininas — isso tudo é parte dos 3,3 bilhões de produtos que entraram no Brasil nos sete primeiros meses de 2023 embalados pela isenção de impostos federais das pequenas compras feitas por pessoas físicas.

Desde meados do ano passado que há incidência de 17% de ICMS (imposto estadual) sobre esses pacotes, mas continuamos a brindar nossos amigos chineses com a não incidência de outros tributos. Enquanto isso, o dono da loja ali da esquina tem que se virar com a infindável combinação de letras de nossos impostos: IPTU, PIS, Cofins, IRPJ, IRPF, fora os que incidem sobre a folha salarial. A indústria nacional também temm que prestar contas com as receitas federal e as dos estados.

A única opção possível para a não taxação dos importados é uma não alternativa, o fim da cobrança de impostos pela indústria e pelo comércio, o que, em tese, estabeleceria uma concorrência razoavelmente equilibrada — e jogaria de vez o país no buraco. 

A discussão sobre as taxas movimenta Brasília nas últimas semanas, entidades empresariais jogam pesado para conseguir o voto de deputados. Mesmo diante da perspectiva de aumento de arrecadação, a bancada governista recuou a partir de um toque de reunir dado por Janja, mulher do presidente Lula, que teme a reação negativa da baixa classe média, eleitorado que resiste ao PT. No ano passado, ela já havia conseguido barrar a cobrança. A oposição era a favor da medida, mas o freio petista enfraqueceu seu ardor e, mesmo, sua fidelidade ao empresariado brasileiro, ninguém quer posar de vilão da história.

Ao defender que tudo fique como está, a representante brasileira de uma dessas megalojas chinesas levantou um ponto importante: alegou que seria injusto taxar blusinhas e mochilas compradas por mais pobres num país que dá aos que viajam para ao exterior o direito de trazer US$ 1 mil (R$ 5.250) em compras livres de impostos.

A observação faz sentido, melhor seria acabar com esse tipo de privilégio pra todo mundo. Não se trata de maldade, mas de algo simples: o imposto que A não paga acaba sendo cpbrado de B. Isso vale pra mochilas, blusinhas, eletrônicos comprados em free shops e para as gigantescas isenções fiscais que beneficiam tantos setores no país.