Por: Fernando Molica

Textor, as falas e os fatos

John Textor no Senado | Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Antes de mais nada, alerto que sou botafoguense — mas procuro manter a imparcialidade ao falar de algo que diz respeito não apenas ao meu time, mas a todo o futebol brasileiro.

Independentemente de preferências clubísticas, as acusações e suspeitas levantadas por John Textor, o proprietário da SAF Botafogo, precisam ser investigadas. Não para tirar títulos de A e entregá-los para B (ou C ou D), mas para garantir um mínimo de transparência a um negócio bilionário.

A paixão está na base da poderosa indústria de entretenimento chamada futebol. Todos aqueles cifrões que passeiam pelo universo da bola estão ancorados no amor que temos por nossos times e pela fé que cultivamos num padrão mínimo de honestidade nos campeonatos que acompanhamos.

De cara, é preciso baixar a bola e admitir que seria impossível acreditar que o futebol ficasse de fora dos escândalos que nos cercam por todos os lados e que atingem praticamente todos os segmentos da vida pública e privada do país.

Não dá pra crer que a CBF e as federações sejam uma espécie de reserva moral da nação, que dirigentes sejam incapazes de cometer algum desvio, que nenhum deles já tenha participado de alguma tramóia. 

A história é cheia de erros de arbitragem e de lances que levantaram suspeitas de manipulação — de um modo geral, times favorecidos são aqueles de maior peso. É praticamente impossível provar que tal marcação errada foi devido a uma falha ou a uma safadeza, mas a entrada triunfal das bets em campo complicou ainda mais a situação.

A popularização das apostas multiplicou as possibilidades de fraudes e de manipulação de resultados. Sabe-se lá o que pode estar por trás da marcação de um pênalti ou de uma expulsão. Isto, num país em que não dá pra confiar na retidão da linha do VAR.

A corrupção e a manipulação de resultados derrubaram a Loteria Esportiva; há quase dez anos, quando o fenômeno das apostas online sequer existia, o Campeonato Brasileiro foi paralisado e jogos acabaram anulados devido à descoberta de um grande esquema de manipulação de resultados protagonizado pelos árbitros Edílson Pereira de Carvalho e Paulo José Danelon.

A transformação do futebol num grande negócio gerou a necessidade de melhores campos e de arbitragens menos suspeitas. A brincadeira passou a envolver muito dinheiro, ninguém vai investir pesado numa atividade se não tiver um mínimo de confiança na honestidade de seus processos. A introdução do VAR é consequência direta não apenas da evolução da tecnologia como também da necessidade de se garantir um padrão aceitável de livre concorrência.

A transformação dos clubes em empresas e a criação das SAFs também contribuíram para a mudança. O fluxo de dinheiro dentro de cada associação esportiva passou a ser mais controlado. Sempre se falou de dirigentes que desviavam recursos de seus clubes, mas o dono de um time não vai roubar de si mesmo.

A exemplo de tantos outros que investem no futebol, Textor faz parte de uma novidade no nosso esporte, é um empresário que quer ganhar dinheiro com seu negócio. Cada eventual taça a ser conquistada pelo Botafogo significará mais grana no seu bolso. Não é por acaso que ele seja o protagonista de um processo de questionamento que poderá ser infundado, mas que tem potencial para mudar estruturas fundamentais do futebol.

Por enquanto, não dá pra apostar no resultado dessa investida feita pelo dono da SAF do Botafogo, mas não é razoável desprezá-la. O jeito fanfarrão do Textor não impede que se preste atenção no que fala, é preciso apurar o que ele diz.