Por: Fernando Molica

Toma lá, lava aqui

Impressionante que os procuradores, Moro e Hardt não tenham percebido que uma jogada como essa acabaria gerando problemas. | Foto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil

Para resumir a história: segundo a Corregedoria Nacional da Justiça, procuradores encarregados de apurar corrupção na Petrobras fizeram um acordo ilegal com o governo americano para pegar dinheiro da própria empresa e usá-lo na fundação privada que seria gerida por eles. Isso, com o aval do então juiz Sérgio Moro e de sua substituta, Gabriela Hardt.

Não preciso um power point para que o caso seja bem compreendido. De acordo com o corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, setores do MPF e da Justiça se associaram para estimular a aplicação de multa milionária à Petrobras. Dos US$ 853,2 milhões, cerca de R$ 4,4 bilhões, 80% iriam para a tal fundação.

Impressionante que os procuradores, Moro e Hardt não tenham percebido que uma jogada como essa acabaria gerando problemas. É provável que, embalados pela quase unanimidade nacional que respaldava a Lava Jato, esses operadores do direito não tenham percebido o tamanho da irregularidade que cometiam e os riscos que corriam.

Tão grave quanto a insensibilidade de procuradores, juízes e desembargadores foi a maneira com que tanta gente embarcou de forma acrítica na cruzada lavajatista, que assumiu viés religioso. É inegável que havia roubalheira na Petrobras, a maior empresa do país era sede de um esquema bilionário de corrupção alimentado pelos lucrativos mercados de financiamento de campanhas eleitorais e de compra e venda de votos no Congresso.

Mas, na ânsia do pega pra capar, muita gente preferiu esquecer que havia um histórico de safadezas na Petrobras. No primeiro volume de seu livro de memórias, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso escreveu que, em 1996, fora alertado para um grande esquema de corrupção na empresa. Condenado pela Lava Jato, Pedro Barusco, ex-gerente da petroleira, afirmou que começara a receber propina em 1997 ou 1998, muito antes do primeiro governo petista.

Os sinais de problemas na Lava Jato eram evidentes no messianismo de Deltan Dallagnol, na combinação forçada de provas, na transformação da 13a Vara Federal de Curitiba no destino de um sem número de ações de corrupção, muitas delas sem relação com a Petrobras.

Era óbvio que a ação do tríplex não deveria estar em Curitiba. Havia a suspeita de que o apartamento fosse fruto de propina a Lula, mas não existia evidência de alguma medida presidencial que tivesse gerado o suposto mimo, nada que indicasse causa e efeito.

Mesmo assim, muitos fecharam os olhos para as irregularidades cometidas pelo consórcio MPF-Moro-Hardt. Uma combinação tão desastrada que cometeria pedaladas judiciais muito graves, algo tão caricatural que acabaria beneficiando condenados. 

A Lava Jato corrompeu o processo judicial brasileiro, gerou cumplicidades e gestos de covardia em instâncias superiores do Judiciário, comprometeu o trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal, tornou menos rigorosas as exigências de cumprimento das garantias individuais, inclusive por parte de muitas entidades e setores da sociedade civil. Pior: passou a ideia de seria impossível punir corruptos sem que houvesse desrespeito do processo legal.

Irregularidades cometidas para que dinheiro da Petrobras virasse combustível de uma fundação privada criaram uma ironia: no fim das contas, os encarregados de combater a corrupção na empresa são suspeitos de, a exemplo daqueles que investigaram, criarem mecanismos para que o dinheiro da empresa fosse desviado. 

 

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