Por: Fernando Molica

Política não é para juízes

Luiz Felipe Salomão, ministro do STJ | Foto: Sergio Amaral/STJ

Há algumas décadas, a sucessão de escândalos envolvendo políticos era tanta que falava-se na necessidade de se tirar a política do noticiário policial. O objetivo está longe de ser cumprido, mas já é hora de se pregar a importância da retirada da justiça da política.

Política é algo inerente a qualquer pessoa que viva em sociedade. Qualquer decisão, principalmente na esfera pública, têm um viés político — é isso que determina, por exemplo, se um governo vai investir numa periferia ou numa área rica da cidade.

Poder constitucional, o Judiciário é também atravessado por interesses políticos, muitos deles, óbvios: é só conferir como é o processo de nomeação de desembargadores e de ministros de tribunais superiores. Quem não tem padrinho morre na primeira instância.

Problema maior é quando a atividade jurisdicional deixa de ser apenas influenciada pelo universo político e passa a ser por este controlada. Mais grave ainda é quando os tais operadores do direito mandam às favas os escrúpulos processuais e transformam fóruns em parlamentos ou em sedes de poder executivo. Isso ficou bem evidente ao longo da Lava Jato.

Ao afastar quatro magistrados que se envolveram em casos relacionados à Lava Jato, o  corregedor-nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, jogou mais refletores na atuação política daqueles que, não faz tanto tempo, posaram como paladinos na luta contra a corrupção. 

Acusada de burlar a ordem processual e de violar o código da magistratura, a juíza Gabriela Hardt demonstrou ter se inspirado no hoje senador Sérgio Moro (União-PR), a quem substituiu na 13a Vara Federal do Paraná.

De acordo com Salomão, a atuação dela passou também pelo pior aspecto da política, a suspeita de tentativa de destinação indevida de valores; no caso, superiores a R$ 5 bilhões. O dinheiro foi oriundo de acordos de colaboração e de leniência. Em sua decisão, o ministro falou em "cash back" — a grana teria sido arrecadada para financiar interesses privados

Os outros afastados, dois desembargadores e um juiz federal são acusados de descumprimento de decisão do Supremo Tribunal Federal ao tomarem, na 8a Turma do Tribunal Regional Federal da 4a Região, medidas também relacionadas à Lava Jato. 

Carlos Eduardo Thompson Flores Lens, Loraci Flores de Lima e Danilo Pereira Júnior determinaram a nulidade de sentenças do juiz Eduardo Appio, que herdara a 13a Vara Federal e que tomara decisões contrárias à de Moro e de Hardt. Appio acabou afastado pela 8a Turma, a mesma que confirmara condenações de Lula.

Os magistrados agora alvo de Salomão não são, nem de longe, os primeiros a deixar que a política dominasse suas atuações nos tribunais. Mas, como Moro, são suspeitos de usarem o poder judicial para extirpar da vida pública aqueles que viam como adversários políticos e ideológicos.

Teriam assim atuado como árbitros de futebol que, dentro da área, chutam para dentro do gol, validam a jogada, abraçam os companheiros de equipe e ainda dão volta olímpica. Ao virar ministro de Jair Bolsonaro, Moro escancarou de vez o time em que jogara. As atuações dele e de Deltan Dallagnol na política evidenciam que ambos, ainda nos tempos das togas, não jogavam contra a corrupção, mas contra o petismo e a esquerda.

O destino de tantos protagonistas da Lava Jato, ex-caçadores de manchetes, deveria servir de alerta para quem tem em mãos processos que tratam do universo político, particularmente, ministros do Supremo Tribunal Federal. 

Juízes não são heróis. Há momentos excepcionais em que medidas urgentes precisam ser tomadas, mas é preciso separar funções e poderes. Quem apita o jogo não pode fazer gol.

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