Por: Fernando Molica

A conta da desoneração é nossa

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. | Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), decidiu que todos nós, brasileiros, temos que contribuir de maneira obrigatória para a aposentadoria das pessoas que trabalham em prefeituras de cidades com até 156 mil habitantes. A conta que vamos rachar este ano é, segundo o Ministério da Fazenda, de R$ 10 bilhões.

A canetada, que restaura a validade de lei aprovada no ano passado pelo Congresso e suspensa por medida provisória do governo, determina que essas prefeituras só precisam recolher 8% e não 20% da contribuição previdenciária patronal. Mas seus funcionários terão direito à aposentadoria normal, como se seus patrões tivessem pago tudo sem desconto.

A palavra "desoneração" é bonita, carrega a ideia de diminuição dos impostos. Foi muito utilizada para a renovação pelo Congresso de outro tipo de benefício, que alivia a contribuição previdenciária de empresas de 17 setores. Ao invés de pagarem os tais 20% para o INSS, as beneficiadas contribuem com um valor entre 1% e 4,5% de sua renda bruta. Adivinhe quem vai ajudar a pagar a diferença? Acertou: eu, você e todas as torcidas juntas.

A lógica é bem simples. Quando falta à Previdência dinheiro para quitar aposentadorias e pensões, o Tesouro Nacional entra em campo e usa o dinheiro que é de todos nós para que os pagamentos sejam feitos. Medidas como a diminuição das contribuições previdenciárias de empresas e de prefeituras aumentam o buraco da Previdência e pesam nas contas públicas. Em outras palavras, o bom-dia é dado com o chapéu alheio.

A lista dos que ajudam a cavar ainda mais o buraco da Previdência é ainda maior: entidades beneficentes sem fins lucrativos — entre elas, grandes hospitais, universidades e escolas privadas — não precisam pagar a parte patronal das contribuições que forram o caixa do INSS. Nós, todos nós, inclusive aqueles que não têm grana para passar na porta de tais estabelecimentos de saúde e de ensino, pagamos por eles.

Políticos, de um modo geral, não ficam angustiados com as sangrias que fazem nos cofres da Previdência por um motivo simples: o tal buraco só explode lá na frente. Quando estoura, sai de baixo. Governantes, então, tratam de exibir o tamanho do déficit previdenciário e de alardear a necessidade de uma reforma que, como as anteriores, corta benefícios e aumenta o tempo necessário para as aposentadorias.

Não se espante, portanto, se daqui a alguns anos os mesmos políticos e setores empresariais que, agora, defendem a desoneração passarem a exaltar a necessidade de uma nova reforma previdenciária. Vão traçar cenários assustadores, dizer que o dinheiro vai acabar, que vovô e vovó vão ficar sem a grana que lhes garante o sustento.

É bem provável que eles não mintam ao exibirem o vermelho que dá cor aos números da Previdência, dados semelhantes foram mostrados para justificar as sete reformas previdenciárias ocorridas desde 1993. Quando houve a última, em 2019, já no mandato de Jair Bolsonaro (PL), muita gente afirmou que os cortes não foram suficientes, que o buraco continuaria a ser cavado.

Eles tinham razão, é impossível fazer com que fique saudável um sistema cuja arrecadação acaba sendo bombardeada. As justificativas são as de sempre, a mais usada é a manutenção de empregos. Como a carga tributária brasileira é mesmo pesada, não é difícil obter a simpatia da população para uma medida que alivie o peso dos impostos, que — lá vem a palavra — desonere empresas e entes federativos.

Vale deixar claro: quem pagará a conta é você; provavelmente, duas vezes. Vai ter seu usado dinheiro usado para subsidiar a aposentadoria alheia. E lá na frente, na hora de se aposentar, é bem provável que as últimas benesses ajudem a diminuir o valor do que você deverá receber pelo resto da vida.

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