Por: Fernando Molica

Lula na retranca

Com as indicações para o STF e PGR, o presidente Lula demonstra a intenção de que quer jogar na defesa, sem correr riscos. | Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Ao indicar o aliado Flávio Dino para o Supremo Tribunal Federal e o moderado Paulo Gonet para Procuradoria-Geral da República, Lula reforça que, no campo judicial, quer jogar na defesa, sem correr riscos.  

A escolha de Dino vai na linha da que levou Cristiano Zanin para o STF. Lula se cansou de ministros tidos como progressistas ou simpatizantes da esquerda que, em momentos decisivos, optaram por outros caminhos, casos de Joaquim Barbosa, Dias Toffoli, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso (os dois últimos, nomeados por Dilma Rousseff).

Na esteira do que fez Jair Bolsonaro, o presidente demonstra preferir ministros seus, terrivelmente lulistas, que só ficariam contra ele em caso de um cataclisma institucional ou de um escândalo de proporções amazônicas.

Em busca dessa segurança, Lula matou no peito a reivindicação de muitos setores que defendiam a escolha de uma mulher, preferencialmente, de uma negra. Indicou um homem branco para a vaga de uma mulher. Caso Dino seja aprovado pelo Senado, Cármen Lúcia será a única representante feminina na Corte.

Lula sabe que ao preferir Dino, despertaria o ódio de setores da oposição, principalmente entre os bolsonaristas. Mas está consciente também que nenhuma escolha seria bem recebida por esse grupo. 

Conhecedor do Congresso, o presidente também não ignora que o arrastão e as pedaladas legais da Lava Jato estabeleceram um critério fundamental para a aprovação de candidatos ao STF: os senadores querem saber se o sujeito é um "garantista" ou seja, se vai pensar bem antes de tomar uma medida radical, se cumprirá todas as etapas processuais antes de mandar um deles para a cadeia. Neste ponto, eles têm o mesmo objetivo de Bolsonaro e de Lula.

A indicação de Dino também faz carinho em dois ministros do STF — Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes — e, em tese, tira o atual ministro da Justiça das próximas corridas presidenciais. Muita gente no PT temia uma candidatura do maranhense (filiado ao PSB) ao Palácio do Planalto.

Se no STF Lula quer alguém que o defenda, na PGR sua opção é por um procurador que, a julgar por sua carreira no Ministério Público Federal, não irá jogar no ataque o tempo todo, não fará do Planalto e dos ministérios seus alvos preferenciais. (Em 2017, durante um congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o então PGR, Rodrigo Janot, aliado da Lava Jato, afirmou que enquanto houvesse bambu ele continuaria a lançar flechas.)

Discreto, voltado para temas constitucionais, também próximo de Mendes e de Moraes, Gonet, longe de ser um praticante de arco e flecha, tende a se equilibrar entre a lógica artilheira de Janot e estilo engavetador de Augusto Aras.

Foi também em busca de uma PGR menos beligerante que Lula abriu mão de um compromisso que assumira em seu primeiro mandato, o de escolher para o cargo o mais votado na lista tríplice escolhida pelos integrantes do Ministério Público Federal. Gonet sequer estava na relação, que não precisa ser seguida.

O presidente sabe que essas decisões vão irritar integrantes de sua base que queriam uma ministra negra e um PGR à esquerda, mas, agora, o que falou mais alto foi a necessidade de evitar uma nova versão do pesadelo que o levou para a cadeia.

 

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