Por: Fernando Molica

Blindados na Avenida

De que adianta mais militares no Rio de Janeiro? O patrulhamento que que o Rio já tinha não é suficiente ou sempre foi mal intencionado? Tá aí uma razão para pensar... | Foto: Agência Brasil

Nem no Golpe de 1964 o Rio viu tantos blindados na rua quanto nas sucessivas operações que, desde 1994 — há 29 anos, portanto — tentam dar um jeito na segurança pública. Nada deu certo, a começar pela ditadura.

A nova versão da GLO (Garantia da Lei e da Ordem) decretada pelo presidente Lula tenta dar alguma direção para o trabalho dos militares, que passaram a ter atuação restrita a áreas afins de cada uma das forças: Exército cuida de fronteiras, Marinha de portos; Aeronáutica de aeroportos.

Mais uma vez, a entrada dos militares parte de um pressuposto errado, o de que há falta de braços para controlar um país tão grande. O problema é que não adianta encher ruas — e portos, aeroportos e fronteiras — de gente se não houver um direcionamento do trabalho, é como o técnico que, perdendo o jogo, enche o time de atacantes e toma gol de contra-ataque. 

Na prática, militares acabam reforçando o trabalho de uma polícia ostensiva que por aqui, costuma trabalhar convenientemente de maneira errada. Melhor: trabalha certo, com objetivos e intenções muitas vezes errados.

Em tese, o que se busca é atacar o tráfico de grande porte, aquele que movimenta bilhões de reais e toneladas de drogas. É possível que, por sorte, a Marinha encontre um navio cheio de drogas em seus porões, mas, a essa altura do campeonato, os caras — sabendo da movimentação de tropas — já devem ter mudado de rumo ou descartado a carga tão valiosa.

O governo federal fala em trabalho de inteligência, de coleta e análise de informações: mas por que isso nunca foi feito? Quantas vezes você, leitor, lembra de de apreensão de grandes quantidades de drogas ou armas em navios ou aviões? Teve aquele caso, em 2019, no avião presidencial. E quais outros mesmo?

Macaque in the trees
De que adianta mais militares no Rio de Janeiro? O patrulhamento que que o Rio já tinha não é suficiente ou sempre foi mal intencionado? Tá aí uma razão para pensar... | Foto: Agência Brasil

Não dá pra atuar contra o tráfico internacional como a mesma lógica varejista das polícias estaduais, incapazes de atacar as redes de abastecimento, focadas nos camelôs que vendem drogas em favelas. Tráfico de drogas é negócio grande, pesado, que movimenta quantidades inimagináveis de dinheiro, não é possível exercer a atividade sem mexer com muita grana, que precisa ser detectada.

Como a coluna Correio Nacional mostrou ontem, há setores do governo que querem transformar em permanente a atuação das FFAA na segurança pública. Mas qual seria o papel dos soldados? Eles vão continuar a revistar pessoas e cargas? Quem vai orientar seu trabalho? É inimaginável que militares fiquem subordinados a determinações da Polícia Federal, seria uma interferência inimaginável em corporações que têm outros objetivos.

Não se pode levar a sério qualquer iniciativa na segurança pública que não ataque a cumplicidade de agentes públicos com o crime organizado. Não haveria a menor possibilidade de a situação ter ficado tão ruim sem a parceria de policiais e de políticos. Presidente e governadores têm certeza da ficha limpa de todos os seus aliados?

A GLO serve para ressaltar o problema, será ótimo se sua decretação também leve a uma discussão sobre o papel das FFAA no Brasil. Mas não dá para recorrer aos militares mais uma vez para tapar buracos deixados e, mesmo, cavados por representantes do Estado. Não é razoável, de novo, fazer dos blindados carros alegóricos que ocupam avenidas e ilustram um enredo pra lá de errado.

 

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