Por: Fernando Molica

Vini: é preciso atuar

Ato em solidariedade ao jogador Vini Jr. em frente a embaixada da Espanha contra o racismo (Cartão Vermelho para o Racismo). | Foto: Rafa Neddermeyer/ Agência Brasil

Já passou da hora do governo da nossa gente bronzeada mostrar seu ardor no caso do Vinícius Júnior. O presidente Lula, que tanto se envolve em questões internacionais, precisa atuar de maneira firme em relação aos sucessivos episódios de racismo de espanhóis contra o brasileiro, manifestações preconceituosas e criminosas que atingem cada um de nós.

Não basta expressar indignação e solidariedade. O governo tem jogar mais pesado, fazer com que nossos diplomatas na Espanha acompanhem todas as investigações; vale usar a antiga medida de chamar ao Brasil o embaixador em Madri, uma forma de protesto que até hoje provoca estremecimento nas relações internacionais.

Cabe a Lula entrar em campo, telefonar para o presidente do governo, o primeiro-ministro deles, e cobrar atitudes sérias e duras, exigir punição para os agressores.

Até por seu papel no processo de espoliação da América Latina, ter dizimado populações nativas e estimulado a escravidão, a Espanha não pode deixar de enfrentar o racismo que os antepassados de seus atuais cidadãos ajudaram a criar — nas Américas, a escravidão teve cor. Como outras potências coloniais, a Espanha lucrou muito com a ocupação de territórios alheios, com o ouro retirado deste lado do oceano. Não pode se omitir.

É preciso que o governo espanhol tenha, em relação aos não brancos, a mesma postura que, depis da Segunda Guerra e do Holocausto, a Alemanha adotou com os judeus. As últimas gerações alemãs não têm nada a ver com o nazismo, mas todos sabem o que foi feito por lá, e sabem que a tragédia não pode ter chance de se repetir.

O governo brasileiro tem que agir no caso Vinícius Júnior e no de outros jogadores vítimas do racismo com a mesma força que atuou para retirar compatriotas de Israel e Gaza. Não deve descartar nem mesmo eventuais retaliações econômicas. Neste ponto, todos podemos ajudar.

Muitos de nós paramos de consumir vinhos de determinadas vinículas gaúchas quando explodiram os casos de trabalho escravo por lá. Uma rede de supermercados chegou a proibir a comercialização de produtos das tais empresas. Por que não diminuirmos a compra do que é feito na Espanha e exportado para cá? Que tal evitarmos consumir o que é oferecido por patrocinadores dos grandes times da La Liga? O que nos impede de cobrar uma posição ativa também dos muitos clubes e associações fundadas por imigrantes espanhóis que se espalham pelo país?

O que está em jogo não é apenas a honra e a dignidade do Vinícius e de outros jogadores brasileiros, mas as de todos nós. Isso precisa ficar claro não apenas com palavras, mas com gestos incisivos do governo e da sociedade civil. 

É aquela história, não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. É preciso criar um modelo de atuação que sirva de parâmetro para outros casos de brasileiros vítimas de qualquer tipo de preconceito. Vinícius e os outros atletas que atuam no exterior, contribuem com país, com o pagamento de impostos, com investimentos, com a simples menção que nasceram por aqui.

Eles nasceram num país que traficou escravizados, que também dizimou indígenas e que até hoje não pagou sua dívida com esses povos, mantém práticas racistas e excludentes. Combater o racismo na Espanha é também reconhecê-lo e atacá-lo por aqui.

 

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