Núcleos esportivos viram ferramenta eleitoral e podem financiar milhares de cabos eleitorais
As 76 milhões de razões para o candidato Gutemberg Fonseca querer manter o controle da Secretaria de Esportes
Por Cláudio Magnavita
“Deus protegei-me dos amigos, pois dos inimigos eu cuido”. Este dito popular se aplica esta semana ao senador Flávio Bolsonaro que, contrariando a sua intuição, cedeu às súplicas do ex-secretário de Esportes e Juventude do Rio, Gutemberg de Paula Fonseca. Ligou para o governador e pediu a nomeação do advogado Alessandro Pitombeira Carracena para a pasta que cuida da política esportiva do estado.
Um telefonema do senador ao governador na manhã do dia 13 pedia que a nomeação fosse realizada no próprio dia. Há menos de 10 dias, a secretaria vinha sendo ocupada pelo oficial bombeiro Marco Aurélio Paes, com larga experiência na gestão pública, amigo de Gutemberg há mais de duas décadas e responsável pela entrada do “Gutinho” no setor público. Conhecido pela sua austeridade e respeito, a súbita exoneração causou perplexidade.
O mistério foi resolvido seguindo os últimos passos de Marco Aurélio Paes, que esteve na Casa Civil e Secretaria de Governo (SEGOV) tentando resolver o impasse do ERREJOTA em Movimento, um dos esqueletos que encontrou no armário junto com bolas de basquetes, redes de futebol e kimonos.
Em pleno ano eleitoral e nas barbas do TER, foi realizada a licitação do programa que colocará na sua primeira fase 500 núcleos esportivos em todo o estado, contratando três funcionários para cada local. O valor da primeira fase é de R$ 76.000.000,00 (setenta e seis milhões de reais) e os contratados prestarão serviço por um ano à empresa FairPlay, que venceu a licitação. O projeto total tem três fases, com 500 núcleos cada, um total de 4.500 pessoas em pleno ano eleitoral.
A engenharia eleitoral de Gutemberg Fonseca, candidato a federal pelo PL como o deputado do senador Flávio Bolsonaro, reservou 300 (trezentos núcleos), exatamente isso, três centenas de núcleos, totalizando 900 pessoas remuneradas pelo programa, para atuar como seus cabos eleitorais, todos remunerados pela verba pública da secretaria.
O uso político do programa “ERREJOTA em movimento” fica caracterizado pelos poucos políticos que estão sendo chamados para ganhar sua conta dos núcleos. Surpreendentemente, Fonseca não convocou nenhuma das estrelas bolsonaristas. Enquanto exclui políticos do partido, como Anderson Morais e Charles Batista, ele destinou 50 núcleos (150 pessoas contratadas) para um deputado do PT. Moralidade a parte, será difícil para o rapaz justificar que deu 50 núcleos para um parlamentar petista, em detrimento dos colegas do PL.
Longa manus
Não deixa de ser curiosa a indicação de Gutemberg, que forçou o senador Flávio Bolsonaro a fazer a ligação. Alessandro Carracena é advogado do próprio Gutemberg em diversas ações na Justiça. A parceria dos dois é antiga. Quando foi secretário Municipal de Ordem Pública na gestão Marcelo Crivella, Fonseca escolheu o advogado como subsecretário e, depois, como sucessor. É neste ponto que a traição se manifesta em dose dupla, elemento desprezado pela política. Carracena e Fonseca processaram o próprio prefeito, que os nomeou secretário de Ordem Pública. Além de Crivella, o Partido Republicanos é réu no processo de cobrança de dívida de campanha. Carracena foi o advogado da empresa de Gutemberg contra o ex-prefeito.
Na Secretaria de Esportes, caberá ao novo secretário responder as investigações do Ministério Público do Rio sobre as acusações de compra superfaturada de bolas de basquete e outros itens esportivos. Outro “pecado” do secretário exonerado foi ter interrompido o fornecimento de itens polêmicos comprados na gestão de Gutemberg. Corre na secretaria a informação que foi feito o atestado de recebimentos de materiais esportivos sem a devida entrega, só para acelerar o processo de pagamento.
Os pecados de Gutemberg Fonseca
Entre os bolsonaristas, a figura de Gutemberg Fonseca é controversa. Ele usa e abusa do nome do senador Flávio Bolsonaro, atropela com a sua candidatura a possibilidade de eleição de Max do BOPE e Hélio Bolsonaro, além de outros candidatos a federal pelo PL. Utiliza toda a máquina da Secretaria de Esportes só para a sua candidatura, desequilibrando a disputa com colegas de legenda. Antes de entrar no governo Cláudio Castro, Fonseca exigiu que, além do Esporte, lhe dessem as Relações Institucionais, queria ser o interlocutor do Rio com Brasília.
Para Fonseca, a nomeação de Carracena pode ser temporária, até o senador escolher um nome definitivo. Ele próprio confessa que na terça, 12, a vontade do senador era ficar longe de qualquer indicação para o Esporte. O desespero de “Guto” se justifica. Ele tinha 76 milhões de razões para querer a pasta e viabilizar a sua eleição com os núcleos esportivos espalhados pelo estado e nomeando 4.500 pessoas para trabalharem a seu favor, sem medo de ser barrado pelo Tribunal Regional Eleitoral ou pelo Ministério Público estadual, que já o tem na mira.