Alta rotação para o Tremendão
Sucesso de 'Ainda Estou Aqui' aumenta a procura por 'E Preciso dar Um Jeito, Meu Amigo', a canção gravada por Erasmo Carlos em 1971 e que é destaque na trilha sonora do longa
A balada "É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo", de Erasmo Carlos (1941-1922), está sendo descoberta pelas novas gerações a partir do sucesso do aclamado filme "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres e Selton Mello. A faixa, que integra a trilha sonora do longa, foi lançada originalmente no repertório de "Carlos, Erasmo", sétimo álbum da discografia do cantor e compositor, coincidentemente lançado em 1971, mesmo ano em que o político e engenheiro civil Rubens Paiva foi preso pelo regime militar.
A grandiosa repercussão do longa contribuiu diretamente para o aumento do consumo da música de Erasmo nas plataformas digitais. Logo após a vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro, na categoria de Melhor Atriz em Filme Dramático - e a gigantesca reverberação sobre a performance da atriz em mídias de todo o mundo -, reacendeu a criação de postagens nas redes sociais ao som da canção do Tremendão.
Somente no Instagram foram mais de 160 mil criações, sendo 90 mil com Music Sticker (recurso que permite que a postagem seja feita com uma música à escolha do usuário, incluindo GIFs com partes de sua letra) e mais de 50 mil criações de outros tipos. O número de visualizações na plataforma, que era de 200 mil, chegou a alcançar 4 milhões. Em termos de consumo, a canção, que tinha menos de 25 mil streams/dia, atingiu o pico de 120 mil streams diários.
Em recente entrevista ao Los Angeles Times, Walter Salles falou sobre a importância da música de Erasmo na trilha sonora do filme: "A escolha dessas músicas [da trilha sonora] foi extremamente importante para nós, porque naquela época [anos 1970], as músicas que você ouvia definiam você, diferente de hoje, quando algoritmos definem o que você vai ouvir. Nesse sentido, a inclusão de 'É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo', que aparece na metade e nos créditos finais, foi essencial", explicou o cineasta.
Lançado em 1971, "Carlos, Erasmo" é um marco na discografia de Erasmo Carlos e um dos álbuns mais importantes do rock brasileiro. Gravado em um período de grande efervescência cultural e política no país, ou seja, os anos de chumbo, o disco revelou um lado mais ousado do artista forjado pelo movimento da Jovem Guarda.
Com o fim da Jovem Guarda, passou a ser visto com desconfiança pela crítica e por parte do público. Era preciso se reiventar, mas qual caminho seguir? Foi nesse contexto que André Midani entrou em cena. Em 1971, o então diretor da Philips contratou Erasmo Carlos para a gravadora e ofereceu ao Tremendão mais do que um contrato: deu ao artista total liberdade criativa.
"O André Midani me levou para a Philips, me deu plena liberdade e me disse: 'Você vai gravar o que quiser, com quem quiser, da forma que quiser. Faça o que você quiser, mas faça. É importante qualquer coisa que você crie'.", contava Erasmo em entrevistas.
A produção do álbum ficou a cargo do maestro e arranjador e Rogério Duprat, um dos principais nomes da Tropicália. Duprat foi fundamental para a sonoridade inovadora do disco, utilizando arranjos ousados e explorando instrumentos como guitarras distorcidos e o órgão Hammond, dando uma sonoridade psicodélica a algumas faixas, entre as quais "É Preciso dar Um jeito, Meu Amigo".
Mas esse nem foi o grande hit do álbum, que trazia 12 canções, todas feitas em parceria com o amigo Roberto Carlos. "Carlos, Erasmo" deu à MPB tesouros musicais como "De Que Valem Os Meus Olhos", "Meu Nome é Gal" e "Como Dois e Dois". Passadas décadas e décadas, "Carlos, Erasmo" é considerado um álbum fundamental para a evolução do rock brasileiro. Sua sonoridade inovadora e suas letras marcantes influenciaram diversos artistas e bandas que surgiram posteriormente.
"É uma grande satisfação falar sobre o legado do meu pai. Ele sempre dizia que queria ser lembrado pelas músicas, e eu acho que este momento agora é muito emblemático, porque ele está conquistando o mundo, literalmente, com uma música que, inclusive, nem fazia parte das mais tocadas dele e que agora está sendo redescoberta através das plataformas digitais. Esse lado mais interessante e incensado dele, que é o disco 'Carlos, Erasmo', e a música 'É preciso dar um jeito, meu amigo', juntamente com a canção 'Gente Aberta', exemplificam muito isso. O Erasmo tinha uma satisfação muito grande com esse lado em que ele falava questões existenciais da humanidade e os grandes questionamentos que ele tinha. Creio que a música ganhará mais destaque ainda com essas três indicações do filme ao Oscar. Eu, como mero emissário do legado do meu pai, fico emocionado imaginando ele aplaudindo na plateia, com uma pipoca na mão, e pensando: 'Eu cheguei de muito longe, e a viagem foi tão longa…", comemora o empresário Leonardo Esteves, filho do nosso querido e saudoso Gigante Gentil.